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Cinco poemas de Noélia Ribeiro



Paixão pela paixão

O apaixonado entra no mar

sozinho, cego ao objeto, que,

esquecido entre as pedras, espreita-o.

A onda incita o prazer.

A espuma ameniza o desassossego.

A suposta metade, deitada na pedra,

sucumbe ao calor, enquanto ele

brinca na água como um garoto.

Ao seu coração entusiasta

o espelho cristalino basta.


Imiscível, a paixão prescinde do outro.




Todos natumba com.Bukowski

Charles, ninguém se importa com você.

Seu poema não importa.

Nem a lama nos sapatos do jovem

que acaba de fugir de casa e

tem nas mãos um pássaro

com a perna quebrada.

Observo da janela da sala:

ninguém se importa com eles.

Você não sabia?

A cerveja que busco na geladeira, derramo-a

em dois copos e, solitária, brindo ao amor.

Que importa se os transeuntes

deixaram os olhos em casa?




Aqueles eles

Porque aparecem como alazões

de crinas douradas

atraindo o olhar de amazonas ávidas,

acreditamos neles.


Porque batem à porta como cãezinhos

esfomeados

lambendo os pés de mães e filhas,

acreditamos neles.


Porque adentram nossa casa

como ursos pelosos

afastando o inverno da solidão,

acreditamos neles.


Quando deles emerge o monstro

de gigantescas patas que nos violenta

o corpo e a humanidade,

ninguém acredita em nós.




Guernica

Há um quê de desumano em meu abraço

Não percebe?

Possuo destroços em lugar de órgãos

infortúnios de um tempo sem pecado

o traço de Picasso na face

e nas extremidades pequenas avarias


Creia:

houvesse algo entre nós, desmoronaria




Os sapotis

No meio do caminho de minha infância,

na Rua do Lima, tinha

duas pedras parentais, que, mais tarde,

escondi no bolso do vestido.


Tinha um ser indecifrável,

com várias identidades: moço,

guarda, homem do saco, cuja

chegada próxima era sempre procrastinada.


Tinha a escola, uma casa pequena

para abrigar tanto céu e tanto inferno

trazidos nas mochilas das crianças.


E tinha as carambolas e

os sapotis que exterminavam

medos e colocavam sonhos

em seu lugar.


Os sapotis nefelibatas me ensinaram a escrever poemas...

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