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DOSSIÊ A DIÁSPORA PASSENSE

Atualizado: 1 de jan.

ORGANIZAÇÃO: ALEXANDRE BRANDÃO

APRESENTAÇÃO: ALEXANDRE MARINO


Congada por Tassio Lopes

A cidade de Passos, localizada no sudoeste das Minas Gerais, é referência de uma efervescência literária notável muito anterior ao tempo das festanças literárias. Ecos que dão ideia dessa efervescência aparecem, sem mais nem menos, por toda parte, assim, ó: sou de Passos, moro no Rio, sou de Passos, moro em Belo Horizonte, ou sou de Passos, moro em Brasília – e logo somos sensibilizados para o fato de que escritores como Alexandre Brandão, Antônio Barreto e Alexandre Marino, que respectivamente assim se identificam, não são apenas eles; são elos numa cadeia produtiva literária cuja chave é de base geográfica, está numa drummondiana cidadezinha qualquer. Mineira, no caso, mas não por mera coincidência, claro: o país é continental, com seus 5568 municípios – até o fechamento desta edição; outros devem estar surgindo –, além do distrito federal. A desigualdade reinante em todos os planos, a começar pelo econômico, é o gatilho para a produção de diásporas de escritores-trabalhadores, especialmente, que se vêem obrigados a sair de sua terra natal à procura de lugares para sobreviver, ou melhor: para não deixarem que neles morra o sonho de ser escritor. Há uma diáspora literária passense, como há outras que precisam ser visibilizadas, e por isso Sphera propôs a Alexandre Brandão que nos apresentasse a alguns dos seus integrantes. (Anelito de Oliveira)



 

Sumário



 


O protótipo de uma

comunidade literária


ALEXANDRE MARINO



Em dezembro de 1972, começava a circular em Passos, sudoeste de Minas Gerais, a revista literária Protótipo, criada por um grupo de estudantes de ensino médio. A cidade, às margens do Rio Grande e com vista para a Serra da Canastra, era ainda a estação terminal do ramal ferroviário da Companhia Mogiana, que ligava o sul de Minas e o Noroeste de São Paulo. Era fim de linha, mas tinha um dos mais belos prédios que a ferrovia deixou depois da desativação gradual de todas as estações.


A revista Protótipo, sob a edição de Antônio Barreto, teve sete números até 1975, e foi reconhecida e comentada em alguns dos principais veículos de imprensa do país. Prova de que “a televisão não conseguiu destruir completamente a província”, como escreveu o cartunista e escritor Ziraldo no semanário Pasquim em 1973, a Protótipo causou certo mal-estar nos meios conservadores de Passos, especialmente entre os militares, que tentaram, sem sucesso, impor a censura prévia aos textos publicados.


Para os integrantes da revista, que lá publicavam suas angústias e questionamentos em forma de contos e poemas, a Protótipo representava uma diáspora, antes mesmo que fizessem as malas para avançar nos estudos em centros maiores. A revista promoveu contatos com outros jovens escritores de todo o país e até do exterior, despertou seus autores para novas propostas literárias e chamou a atenção de professores capazes de guiá-los nos caminhos infinitos da literatura. Protótipo era, para aqueles jovens, um diálogo entre Passos e o mundo, quando a ditadura militar investia no sufocamento.


Passos tinha na época cerca de 40 mil habitantes em sua área urbana e uma forte tradição religiosa, marcada por festas tradicionais, como o congado, e simbolizada pela histórica capela de N. S. da Penha, patrimônio cultural do município, construída entre 1863 e 1867 e totalmente restaurada entre 2007 e 2009. Hoje com mais de 100 mil habitantes, a cidade tem forte movimento de teatro, música e literatura. A velha estação da Mogiana, desativada em 1976, foi transformada na Estação Cultura, palco de exposições e eventos.


Entre o primeiro e o sétimo e último número, a equipe da Protótipo mudou. Antônio Barreto, Alexandre Marino, Gilberto Abreu, Marco Túlio Costa e Marise Paxecu permaneceram escritores, e agregaram outros passenses que passaram de leitores da revista a integrantes de uma confraria que rompeu os limites das páginas mimeografadas dos anos 70. Alexandre Brandão e José dos Reis Santos são companheiros nessa diáspora, uma viagem pela magia da literatura que desconhece fronteiras. 



Capela Nossa Senhora da Penha por Alexandre Marino


 

TASSIO LOPES

fotos



Panorâmica com serra por Tassio Lopes


Estação Cultura por Tassio Lopes


Estação Cultura por Tassio Lopes

 

Congada por Tassio Lopes

 

 

Congada por Tassio Lopes


Folia por Tassio Lopes


Tassio Lopes

 


ALEXANDRE BRANDÃO



Alexandre Brandão por Helena Brandão


Um abismo


O tio a levou de Paraisópolis à Alameda Santos, onde seria a entrevista de emprego. Como ele não poderia esperá-la, durante o caminho deu-lhe as explicações sobre o ônibus a tomar, onde ficava o ponto, em que momento baldear. A sobrinha agradeceu muito o tio e o tranquilizou, daria tudo certo.


A entrevista não demorou muito, e ela, ao sair, não conseguia avaliar se havia ido bem ou não. Procurou ser espontânea, sem fingir saber o que não sabia. Só lhe restava esperar e torcer. Torcer muito, um trabalho melhoraria a situação da família.


Saiu do escritório, dobrou à esquerda e, na Casa Branca, subiu para a Paulista. Encantava-se com as pessoas bem-vestidas, os carros novíssimos, os prédios altos, imponentes. Tão diferente de seu cantinho, acanhado e pobre, mas, apesar disso, seu, e para onde voltaria em seguida. Repassou as orientações do tio, entendera tudinho. Tudo? Ao chegar à avenida, não sabia de que lado deveria tomar o ônibus. Respirou fundo, buscando se acalmar, logo pediria uma informação e alguém a ajudaria. Não era, com certeza, a primeira pessoa a ter uma dúvida daquelas.


Um pouco depois da esquina, um homem de cabelo bem penteado, sem um fio fora do lugar, vestido num terno impecável e com sapatos brilhando esperava o sinal abrir para atravessar a avenida, a imensa avenida. Antes de se aproximar dele, treinou como deveria abordá-lo. Não falaria em Paraisópolis, era bem provável que ele nem soubesse onde ficava, ou, se soubesse, se assustasse. Não falaria.


— Bom dia, o senhor poderia me dar uma informação?


— Pois não.


— Como eu faço para chegar ao Morumbi?

— Tome um táxi.



Sábado de manhã

 

Durante a semana, por causa de compromissos de Maria e da permanente preguiça de Job, adiaram a discussão. Assim, na caminhada do sábado, tiveram de começar do início. Job falou, Maria o interrompeu, ele bronqueou, ela se desculpou, ele repetiu a frase e continuou o raciocínio, ela ouviu e, como ele ficou calado por um tempo, ela argumentou, ele meneou a cabeça discordando, ela pediu para ele ouvir um pouco mais, ele estendeu as mãos como se lhe desse passagem, ela, antes de continuar, deixou claro que não aceitaria ironias, ele espalmou as mãos com os braços dobrados na altura do peito como se jogasse a bandeira branca, ela então retornou, mas, mal avançava na frase, pigarreou e até mesmo cuspiu, bebeu um pouco de água e viu que se perdera, ele tentou ajudá-la e repetiu a última frase dita por ela, mas ela não reconheceu aquelas palavras, não eram suas, estava cheia das manipulações dele, e ele então foi incisivo, não havia droga nenhuma de manipulação, eram mesmo aquelas palavras, e ela recuou, disse que tudo bem, e, ao dizer isso, se lembrou do que iria falar, só que as palavras saíram erradas de sua boca e ele riu furioso, disse que era só o que lhe faltava, uma acusação daquela era de uma injustiça tremenda, e recordou uma vez em que ele a salvara de uma boa enrascada, e ela, tirando e botando o boné da cabeça, movimento que fazia para ganhar tempo, viu que ele estava certo, nisso, só nisso, e tomou a palavra para dizer que ele não comprara a sua fidelidade, que história era aquela, por acaso queria escravizá-la? Ele disse que ela era muito dramática, o que a deixou transtornada, não aceitava mais esse machismo de fundo de quintal, e ele riu da imagem e perguntou de onde ela tinha tirado isso de machismo de fundo de quintal, se existia outro tipo de machismo, e ela disse que sim, e ele se desculpou, não queria agredi-la, longe disso, mas que ela não se esquecesse de que ele estendera a mão para ela sem querer nada em troca, e ela disse que tudo bem, reconhecia e por isso aceitava até seu machismo de fundo de quintal. Completada a volta em torno da Lagoa, pararam no quiosque do Luciano. Ele a convidou para mais uma volta, mas ela não podia, tinha um compromisso, o que não era verdade.


 

Chuva vermelha


Matei um bandido. Dito assim, livrar-se de um bandido suaviza o mal e encontra quem louve o meu feito. No entanto, um crime é um crime, e ganhar aplausos por ser criminoso me envergonha. Sinto mais que vergonha.


Matei um bandido, não agora, faz um tempo, e o fato tornou-se notório, saiu em jornais — com debate acalorado travado nas áreas de comentários dos sites —, foi discutido nas redes sociais — nas quais, como me mostraria Netinho, se armou um verdadeiro ringue. Um que não se conteve foi meu amigo Jiló, se é que amizade sirva para descrever a relação iniciada na infância, nos bancos da escola, e cultivada adolescência e farras adentro, mas que não passou daí, pois o mundo adulto nos reuniu poucas vezes. Esse amigo, na falta de uma palavra melhor, foi longe em seus elogios, a ponto de me chamar de herói, um super-herói cujo único poder foi uma arma de fogo comandada pelo medo. Medo é palavra minha, Jiló enalteceu em seus posts a coragem do Zoreia, meu apelido de menino de orelhas de abano.


Matei um bandido, e o caso percorreu os corredores da Justiça. Nem pobre, nem rico, tive o bastante para pagar um bom advogado, desses capazes de questionar as provas e, se elas são evidentes, jogar com todas as outras possibilidades: adiamentos, pedidos de mudança de vara, enfim, o advogado, com toda a sua experiência, garantiu que eu nem sequer amargasse um dia de prisão. De prisão real, ou seja, estar metido em um cômodo pouco iluminado e gradeado, ao qual ou se é lançado sozinho (uma minoria) ou na companhia de outros, que serão poucos em cidades menores e inúmeros nas medianas ou grandes. Moro numa cidade média e, se não desfrutasse dos privilégios de homem branco com ensino superior, assalariado com renda razoável, seria jogado numa cela lotada. Lá estariam, prontos para a vingança, os amigos do bandido que matei, lá estariam outros que não podem ser chamados de bandidos, jovens presos — negros na sua maioria — com um baseado ou por conta de alguma contravenção menor. Enfim, eu, um criminoso, não fui preso, o que de pouco adiantou, pois estou preso.

 

Estava em casa sozinho, não, não era uma situação especial, ninguém, mulher ou filhos, havia saído e me deixado desacompanhado; vivo só. Desde que perdi Marília, me ajeitei com a solidão. Cultivo flores e cuido de um pequeno pomar. Vendo as flores e as geleias de manga e jabuticaba que eu mesmo produzo. A comercialização foi, na realidade, uma consequência natural por ter flores e frutas em excesso. Poderia deixar as flores morrerem no pé, mas os vizinhos começaram a me pedir um buquê para isso, outro para aquilo e sugeriram pagar por eles. Com as frutas foi mais ou menos a mesma coisa, a diferença é que resgatei receitas de família e passei a fazer geleias. Enfim, tenho uma renda adicional e não muito grande; o suficiente para um vinho e um presunto espanhol uma vez ou outra. Não tenho empregados, faço tudo com minhas mãos, aproveitando o tempo fora do escritório, aonde, aliás, depois do crime, não mais voltei.


Então, como sempre ou quase sempre, estava sozinho. Passava das dez da noite. A cidade de cem mil habitantes, cujos recentes prédios altos, condomínios fechados e automóveis tagarelam, aceleram, buzinam e freiam o tempo todo, estava estranhamente quieta. Apesar das novas opções de moradia, vivo na casa comprada de meus irmãos, que se mandaram logo depois da morte da mãe e não passam, desde então, de vozes em ocasionais telefonemas. Quando há portador, mando-lhes geleia.


Estava sozinho, volto ao assunto. O silêncio da cidade pouco silenciosa chegava a doer. Fazia calor e deixei a televisão de lado para tomar ar no quintal. Vi uma flor, resolvi colhê-la. Com medo de incomodar os vizinhos com o barulho da tesoura ampliado pela quietude fiz tudo com delicadeza. Quando tirei a flor, desbastei as folhas e os espinhos que me impediam de segurá-la. Operação terminada, girei para voltar a casa e depositar a flor num jarro.


O menino, eu ainda não sabia que era um bandido, estava ali parado, pelo jeito me assistia. Levei um susto, mas me controlei, cumprimentei-o como se fosse um visitante a quem eu esperasse. Ele fez sinal para eu fechar a boca. Ficamos então envoltos no silêncio inusitado daquele dia também calorento. Mexendo na mão do revólver, apontou o caminho da casa. Entramos. Deixei a flor sobre a mesa e, por incrível que pareça, ele a pegou e cheirou. Em seguida fez um som como se raspasse a garganta ou exclamasse — algo assim como “hã!”.

Devolveu a flor à mesa e me disse que precisava de dinheiro, de muito dinheiro.


Abri a carteira e ofereci-lhe os duzentos reais, tudo que eu tinha. Ele riu, apontou a arma para minha testa e perguntou se eu estava gozando da cara dele. Respondi que seria melhor ele pegar a televisão, o computador ou o celular, as coisas mais valiosas da casa. Ele me mandou acessar o banco pelo celular ou pelo computador. Não usava o banco daquela maneira, expliquei-lhe. Sentou-se à mesa, pegou a flor novamente e perguntou se não o conhecia. Não, não o conhecia. Me passou sua folha corrida de assaltos, crimes, me contou que pertencia ao PCC e estava preso na cidade havia um ano, eu não sabia? Além de solitário, sou desinteressado dos assuntos que mobilizam tanto as pessoas, seja a fofoca amorosa ou política, seja a novela de sangue derramado repetida por todos os cantos do país. No trabalho, trabalho. Em casa, cuido das flores e das frutas. E choro a saudade de Marília.

 

Marília morreu jovem. Foi minha única mulher, nunca mais me interessei por nenhuma. Minha mãe ralhava comigo, cobrava que eu vencesse o luto, um homem jovem, capaz, inteligente. Meu pai nunca me disse nada, embora demonstrasse compartilhar da opinião de minha mãe. Meu irmão mais velho, depois de enterrarmos a mãe e de nos vermos pela última vez, me aconselhou uma terapia. Todos me julgavam a partir de seus valores, de suas perspectivas e não seriam capazes de entender o que minha companheira significava. Eu não a trairia. Eu não a traí. Não a trairei.


Quando comecei a cuidar das roseiras, entendi que Marília renascera e vivia ali, vermelha ou rosa, explodindo do botão à flor. Ela estava também no cheiro da jabuticaba florescendo e no doce da manga. Nem por ter percebido essa presença, fugi à proposta de vender as flores e as geleias, pois Marília estava no chão do jardim, na força que dava cor à flor e amadurecia as frutas, e não fugiria. Quando alguém comprava uma coisa ou outra do meu quintal, na realidade, mantinha contato com o sorriso de Marília, com alguma graça que ela dizia. Em forma de flor ou de geleia, Marília visitava os vizinhos, levava-lhes sua beleza e doçura, depois voltava.

 

O bandido levantou a flor e mais uma vez a cheirou. Talvez Marília lhe desse um conselho ou a indicação de uma leitura da bíblia, ou sugerisse algum esporte ou a apreciação das artes. Talvez ela tentasse conter a violência daquele homem, daquele rapaz — daquele menino. Ele me disse que, na prisão, os únicos cheiros eram o dos outros homens, o da comida intragável e o da urina e das fezes acumuladas na latrina localizada no final da cela, atrás de uma meia parede. Fiquei comovido e, de pronto, ofereci a ele um pouco de geleia. Para acompanhar, havia queijo, pão, leite. Aceitou. Coloquei sobre a mesa um pouco de cada uma das geleias, pão de forma e francês, queijo de minas e um meia-cura. Ele depositou o revólver na mesa e, com uma das mãos, pegou o pão francês e, com a outra, a faca, com a qual cortou o pão para depois enfiá-la na geleia amarela. Nesse instante, percebi como eu estava dominado pelo medo. Não era minha hora de morrer, Marilia precisava de mim. Antes de ele levar o lanche à boca, peguei o revólver e dei-lhe um tiro bem na cabeça.


Sangue e flor vermelhos.


O impacto derrubou o corpo com cadeira e tudo. Aproximei-me, e o menino, bandido de extenso currículo ou não, era um menino, tinha uma parte do corpo no chão e outra na cadeira caída. Para quem estivesse vivo, seria uma posição incômoda, mas para ele não fazia a menor diferença.


Bateram à porta. Era Netinho, filho de seu Alaor. Quis saber se estava tudo bem, eles ouviram um barulho parecido a tiro. Mostrei-lhe o cadáver. Netinho não se intimidou, agachou-se e olhou detalhadamente o morto, que deveria ter os seus mesmos vinte anos. Ergueu os olhos e, em tom de quem comenta um gol de um time para o qual não se torce nem a favor nem contra, falou que aquele era o Tirocerto, o perigoso fugitivo. Ele estava orgulhoso de mim e nem um pouco solidário com a morte do garoto.


Depois de Netinho, outros chegaram. Seu Alaor, antigo vereador da cidade, logo ligou para a polícia e para o hospital. Em pouco tempo, um médico tirava minha pressão, me auscultava, me receitava um calmante e um banho. Dona Neuma me trazia um café muito doce. Tomaram conta da casa. Não reagi, quer dizer, por um tempo fiquei imóvel na cadeira em que o médico me mandara sentar, depois, sem falar com ninguém, me levantei, fui à cozinha, peguei a flor e a coloquei ao lado do tal Tirocerto, o menino. O menino.


O delegado me disse que tomaria meu depoimento, não precisaria ser naquele instante, mas que ficasse tranquilo, todos sabiam da violência do bandido, era certo que eu agira em legítima defesa. Os peritos mexiam e remexiam em tudo. Um deles comentou por alto que o tiro tinha sido à queima-roupa, o bandido estaria sentado e o tiro viera do alto. Na saída, o delegado afirmou que o que vira ali era um homem de bem salvar a própria vida e ainda garantir um pouco de paz à sociedade. A cidade, o estado e o país deveriam erguer um monumento em minha homenagem, completou.


Apesar da inocência relatada no boletim policial, pelo jeito um acerto entre o delegado e a equipe técnica, como já disse, abriu-se um processo. Contratei um advogado, a quem contei a verdade. Eu era um assassino. Matei um bandido? Não, matei um menino, friamente.


O advogado reagiu mal a meu relato. Não era possível seguir com aquela história, a própria perícia apontara a briga antes do tiro. Havia até o meu exame de corpo de delito como prova. Nunca fiz tal exame, esclareci ao advogado, e ele, com energia, me orientou a ficar de bico calado, não era possível agir contra mim mesmo. A partir daí, seguiu-se toda aquela estratégia para me livrar da prisão. Da prisão física. Preso eu estou.


Quando a vida acalmou um pouco, voltei à rotina. Quer dizer, não voltei ao trabalho, o advogado fez com que me dessem uma licença por tempo indeterminado. Retornei, portanto, a uma rotina caseira. Acordar, enfrentar o dia, dormir. Nem um passo na rua, nem mesmo para compras, que comecei a pedir por telefone. Netinho passou a me ajudar, prestativo e discreto, um bom garoto, verdadeiro amigo. Fechei a porta para aqueles que iam a minha casa saudar o justiceiro; Jiló, o principal deles.

 

Marília murchou os botões das flores, deixou o fungo tomar conta da mangueira e esterilizou a jabuticabeira. Eu me esforçava, mexendo a terra, espalhando tonificantes, regando, mas o jardim negava-me o direito de colher a alegria de Marília no forte das cores, no doce dos sabores. Além de preso, havia sido abandonado.

 

Pedi a Netinho para descobrir o nome de Tirocerto, sua cidade natal, se possível, o nome dos pais. Evilásio Silva José, o Tirocerto, tinha vinte e dois anos e nascera a uns 500 quilômetros de minha cidade. Era filho de Joaquim José e Marinalva Silva José. Ainda moravam lá? Estariam vivos? Choraram a morte do filho e o enterraram?


Tomei um ônibus até Belo Horizonte. De lá fui para Três Marias e, por fim, para São Gonçalo do Abaeté. Desci e saí caminhando pela cidade pequena. Passei pela porta da prefeitura, pela igreja, cruzei a pracinha. Por fim, sentei-me numa lanchonete, Xodó era o nome. Pensei que, sendo pequena, a cidade deveria conhecer muito bem a história do bandido, não seria difícil encontrar seus parentes. Puxei assunto com a balconista e, sem muito rodeio, perguntei se ela sabia se a família de Tirocerto ainda morava na cidade. Ela respondeu com a maior naturalidade, até com espanto, como era possível alguém não saber que dona Marinalva morava logo ali, duas esquinas acima?

 

Bati à porta. Uma senhora não muito velha, longe disso, não deveria ter mais de 45 anos, atendeu. Ela me olhou sem espanto ou expectativa. Perguntei se era dona Marinalva, me respondeu que era Marília. Estremeci e refuguei o convite para entrar. Ela insistiu, me ofereceu água. Entrei e tomei a água. Resolvi perguntar de novo o nome dela, mas daquela vez manteria os olhos em seus lábios, algo me dizia que ela falava uma coisa e eu ouvia outra. Marília: o som era esse. Não pude decifrar se os lábios disseram Marinalva.


Perguntei então se era a mãe de Evilásio, o Tirocerto. Balançou afirmativamente a cabeça, como se, ao não falar, não deixasse margem a dúvidas. Comecei a falar da morte de seu filho, ela baixou os olhos, tirou do bolso do vestido um terço e o agarrou. Eu não sabia bem o que fazia ali nem o rumo a dar à conversa. Ela começou a perguntar se eu era... e não foi além. Também evitando as palavras, assenti com a cabeça. Marília — não podia ser Marília, era Marinalva — levantou-se, saiu do cômodo, demorou um pouco e voltou com uma flor vermelha nas mãos, que me entregou. Apontou então a porta da rua.


O caule da flor estava cheio de espinhos. Enfiei os dedos neles até furar a pele. As gotas de sangue em cada ponta de dedo intensificaram o vermelho da flor e me fizeram recordar da chuva vermelha esguichada da testa de Evilásio, o menino. Na lanchonete, com os cotovelos apoiados sobre o balcão e as mãos espalmadas no rosto, a vendedora assistia à televisão. Mais uma Marília.

 


 

 

 

GILBERTO ABREU

 


Gilberto Abreu por Fê Souza


O Morto


                   Faz tempo.

                   Na modorra da pequena cidade, a vida escorria como a areia de uma ampulheta. Afora os afazeres comuns do dia a dia, o calendário reservava alguns de festança. A do padroeiro. As de um ou outro Santo. As datas nacionais que poucos entendiam o que fossem eram chatas, já que nelas não ocorriam as comilanças e nenhuma beberagem. Desprovidas de qualquer graça. Com todo o respeito.

                   Ah! Mas havia os enterros.

                   Neles, como é sabido, o populacho se reunia ao redor do “de cujus”, no geral qualquer sujeito de posses, a fim de trocar alguns chistes, conversas apimentadas, intrigas sobre quem herdaria o quê, além de consumir litros de café e uma ou outra cachaça. Quer dizer, muita.

                   Foi quando morreu o Idalino.

                   Sem nenhuma doença que a previsse, a “indesejada das gentes” chegou.

                   Morava nos altos da Penha. Naquela época, os defuntos eram levados nos ombros de quatro ou seis pessoas, dependendo do peso do indigitado. Não era tarefa fácil, uma vez que o Cemitério ficava a uma légua de distância, no lado oposto da cidade. Até chegar ao Centro, cortado por um riacho, nem tanto, porque era morro abaixo. Dali, a coisa se complicava. Ladeira após ladeira, as duplas de carregadores se revezavam por conta do esforço.  

                   Na subida da Rua Nova ouviu-se um barulho no caixão.

                   Seu Nestor ordenou aos carregadores que depusessem o esquife no chão. As pessoas em volta esbugalharam os olhos, estupefatos. Calma e nervosamente o fizeram. Desatarraxaram os longos parafusos. Idalino, esbaforido, levanta-se ofegante por entre aquelas flores já esmaecidas pelo calor, emite um grunhido e com grande esforço diz:

                   — O quê que é isso, minha gente. Eu não morri, não...

                   O mesmo Nestor, sujeito muito forte por conta da lida com o gado, deu-lhe um safanão que o prostrou de volta ao cetim roxo do caixão, dizendo de maneira peremptória:

                   — Deixa de ser besta, Idalino!

                   — Você não vai querer saber mais que o Doutor Madureira...

                   Morro acima, o féretro seguiu.


 

O Colete


Joaquim Nepomuceno assim o chamavam. Nem todos, porém.

Ao vê-lo passar, empertigado, portando uma bengala de castão prateado do tipo cabeça-de-cachorro, parecia desfilar. Tinha hábitos tão previsíveis que muitos acertavam as horas dos relógios quando de sua passagem pela Rua do Meio, em direção ao Café Globo. A bengala tocava o chão em cada dez ou quinze passos. Como se fosse uma pontuação de seus pensamentos.

O ritual se repetia na sua volta, rua acima.

Morava na Pensão do Anacleto que ficava na parte superior da Praça do Rosário. Não era dali. Apareceu na cidade na época da construção da represa hidrelétrica. Dizia-se que cumpria tarefas burocráticas no escritório da Companhia. Não falava com ninguém. Respondia aos eventuais cumprimentos com um leve meneio de cabeça. Respeitoso.

Até que um dia, um dos moleques de um tal de Zé Pereira, do terraço do sobrado onde vivia, gritou:

— Ô Colete Preto!

O tal Nepomuceno parou na calçada. Apoiou-se na bengala com as duas mãos no castão de prata cabeça-de-cachorro. Levantou a cabeça e gritou:

— Colete Preto é a puta que o pariu...

Muitos se assustaram com a quebra de solenidade naquela caminhada diária. O fato é que, de quadra em quadra, a cena se repetia. O semblante daquele senhor tão cerimonioso se alterou. Nada sobrou do antigo rosto sereno. Agora, franzia o cenho em desagrado.

Numa Semana Santa qualquer, o cortejo da Procissão do Enterro passou pela Rua do Meio. As pessoas cantavam, comovidas:

“Os anjos

todos os anjos...

louvam a Deus

para sempre, Amém...”

Em meio a um magote ao redor do Crucificado, lá estava ele, o senhor Nepomuceno. Trajando o mesmo terno cinza, o colete e a mesma bengala em que de quando em quando se apoiava no intervalo dos cânticos. Foi quando uma voz esganiçada de um moleque atrevido irrompe a pausa num grito que todos pudessem ouvir:

— Ô Colete Preto!

Acompanhando o ritmo das vozes que entoavam, o senhor Nepomuceno cantou:

“Colete

  colete preto

 Colete preto

 é a puta que o pariu...”

Foi assim.


*


A Minha Primeira Morte

(Ladeiras de Passos)

                  

canto I

Vim de ver-te

nos meus passos

onde, por onde

em tuas ruas de pedra

seres paralelebípedes

traçam a geometria

dos desencontros:

uns, destilando medo

colhem aguardente

dos olhos, na subida

de tuas ladeiras

verticais, como as

de um calvário.

Outros, limpam as

goteiras de sangue

que escorrem dos beirais

e salpicam os ombros

dos engolidores de terra.

por séculos de instantes

em tuas colinas e baixios

laboro a argamassa de pranto

que cimenta o tempo.

canto II

Vim de ver-te

nos meus traços

entre, por dentre

imagens de santos

talhados na madeira

e na memória:


Há, os que rezam

na polifonia dos

fanáticos, os que

incensam os teus

altares, em fumos

incessantes.

uns são címbalos

outros, báculos

todos são,

eles mesmos

turíbulos regulares.



canto III

Vim de ver-te

nos meus planos

quando, por quando

lancetou-me a centelha

da esperança:


minhas palavras

envoltas em fogo e brasas

ecoaram por teus vales

vincando um dicionário

de rugas no meu rosto.

Sim,

Vim de ver-te

nos meus sonhos

agora, por agora

pois retomo a matraca

dos sacristães

e convoco a procissão

dos deserdados.



canto IV


Pedra de imóvel ladeira!

Ladeira de imóvel pedra!

Gestas, juntas

o consumado fato

do meu finado gesto.


Em tuas vielas gastas

ouço velhas como harpias

carpindo minha mortalha.

Ouço cantos deprimentes

de verônicas inverossímeis

carpindo minha mortalha

para a multidão atônita...

De ver-te venho

depois de morto

amargo travo

queimando na boca.

Renascido

 no meu rastro

o canto lavro:

Ladeiras de Passos!

Bateio em tuas pedras

as minhas palavras.

Ladeiras de Passos!

Faísco em tuas tocaias

os meus pedaços...


 


MARCO TÚLIO COSTA



Marco Túlio Costa por Aluísio Souza


Vazio


Na fábrica de fantoches, desmancham-se num lago de lágrimas livros e mais livros no preparo da massa.


O papel machê, fragmentado universo literário, resulta dessa bruxaria, amálgama de sutilezas nas traições de Machado e promessas que Dias Gomes não paga. E nessa alquimia mesclam-se os enredos, quebra-se a lógica, cambaleia o ritmo compassado, formam-se tramas intricadas onde se perderia Homero em busca de seu Ulisses, de quem só se encontrarão pegadas de Diadorim, numa rua molhada de Dublin, ou Macondo, não se sabe. Resulta a mistura em novo bestiário para o encantamento de Borges, onde habitam Guimarães Maiakóvski e Vladimir Rosa, em poética prosa. Nesse novo aspecto, Lispector Kundera com leveza pondera sobre a metamorfose de Kafka em massa plástica. E enquanto os operários moldam dos bonecos a cabeça, esses questionam ‘será ledo engano ou Lêdo Ivo, pensar que meu corpo, é parte Qorpo-Santo?’ Também é cinza cerebral o papel machê, ainda que a química seja atroz, nele ainda se lê um verso de Alexandre Marino com quinze palavras de Raquel de Queiroz.


Feita a modelagem, ficam essas cabeças ocas, que piram Pirandello com a representação de plurividas em palcos jamais pisados. Pintam-se as cabeças, olhos expressivos, boquinhas róseas, montam-se os bonecos com o corpo de pano.


Expostos nas vitrinas, os fantoches sonhadores, com plurialmas de Julieta, Capitão Rodrigo e Quixote, pela vitrine contemplam consternados as figuras humanas que transitam na rua, cascas vazias, ocas existências despoetizadas, incapazes de enxergar o moinho que os desafia, como a pedra no meio do caminho.



Verdade

Afasto altivo a túnica que imagino pender desde meu ombro esquerdo até o quadril, onde me cinge um cinto. Num improvável personagem me transforma a pergunta do aluno. Atira-me de costas contra as seculares pedras que pavimentam os caminhos da Filosofia.


— E então? No seu texto, um velho compra a verdade e paradoxalmente dela se torna escravo. Para o senhor, o que é a verdade?


Colocou-me ainda uma coroa de espinhos? Nem tanto. Mas sangro em busca da resposta e respingo minha túnica branca. Não sou eu a verdade, quiçá uma duvidosa possibilidade, talvez uma mentira bem contada. Nem vou dizer que sou o que sou, se nem sei o que é ser.


— A verdade é um avião atirado contra duas torres – respondo, mirando o aluno nos monitores da alma, os olhos claros onde assisto à imagem que de imediato se declara.



Ratoeira


Sérias instruções para armação de uma ratoeira:


1.       a primeira providência é a isca indicada, que precisa se conformar ao gosto do rato, que vai do frugal ao refinado.

2.       Sobre a plataforma de madeira, de metal ou de fingimento, acórdão, acordão, trato, conluio ou entendimento, coloca-se bem ajustado à unha da trava toucinho, ou queijo, ou pão, ou circo, ou verba, ou a propina combinada.

3.       Com discrição, se possível usando mão alheia, puxe em direção contrária o martelo até o limite da mola e prenda no furo (jornalístico de preferência) o gancho da barra de retenção.

4.       Então, esconda-se para o desfecho, que será um escândalo ou delação premiada.





 


JOSÉ DOS REIS SANTOS

 


José dos Reis Santos por Aluísio Souza


A chegada do progresso

 

Em poucas horas, todos já sabiam da notícia: a chegada de um gringo ao povoado. Homem alto, barbudo, chapelão na cabeça e óculos escuros. À hora do almoço, dobrou o número de curiosos nas imediações da Pensão Central – a única do lugarejo.


Com um forte sotaque inglês, o estranho se comunicava apenas com o seu auxiliar, o qual carregava alguns aparelhos esquisitos. O homenzarrão olhava sabe-se-lá-o-quê naqueles equipamentos e depois anotava num caderno.


Os moradores achavam aquilo tudo muito bonito. Era o progresso que chegava a Brilhante. E, como eram posseiros, ficaram mais animados ao saber que as medições seriam usadas para o registro das terras. Afinal, o governo não se esquecera deles.


Semanas depois, os curiosos se aglomeravam na porta da Pensão Central para ouvir a segunda notícia: um metal raro e caro descoberto no subsolo do povoado seria explorado por uma empresa estrangeira, a qual já fizera o registro de todas aquelas terras em seu nome. Todos teriam poucos meses para procurar outro rumo, sob pena de sofrer ação de despejo.


***



O melhor café do mundo

 

Naquele dia, após nos servir o café da tarde, minha avó ficou mais tempo saboreando o seu café e a fatia de queijo fresco. Eu e meu irmão havíamos repetido a mesma frase a ela, depois de tomar o nosso café: “A senhora faz o melhor café do mundo, vó!”. Ela ria com serenidade.


Mas, ao vê-la com um semblante mais alegre que o de costume, eu quis saber:


— Vó, a senhora está feliz por que a minha mãe e o tio Zezé vão chegar de viagem hoje?


E ela, com um sorriso, respondeu:


— Sim. É por isso, meu filho!


E não falou mais nada.


Eu e meu irmão voltamos para o quintal para terminar nossa obra: uma casinha de capim e taquaras, tudo bem amarrado com barbante. Mas, enquanto voltávamos para o quintal, ainda escutei minha tia Maria falando baixo com minha avó:


— Eles ainda não sabem?


Eu não pude ouvir o que Vovó Nenésia respondeu. Mas, preferi deixar a curiosidade de lado e voltar para concluir a casinha.


Pouco depois, ouvimos gritos no casarão. Era a voz de minha avó e das minhas tias. Corremos para lá, com o coração aos pulos.


Ao entrarmos na casa, vimos minha mãe, meu tio e um homem cabeludo e barbudo na sala. Minha avó estava abraçada ao homem barbudo aos prantos. Minhas tias também choravam.


— Graças a Deus que você voltou, meu filho!... Graças a Deus que está vivo... depois de tanta injustiça... — dizia nossa avó aos soluços.


Era o meu pai. Havia saído da cadeia, onde estivera preso por mais de um ano. Ele era um dos líderes da greve geral contra o governo militar.


Depois que meu pai nos abraçou bem apertado, Vó Nenésia disse a todos:


— Agora, venham tomar “o melhor café do mundo”... – E piscou para mim e para meu irmão.


***


 

O Homem das Cabras

 

            Logo de manhã, quando levava seu minúsculo rebanho para o pasto, o Homem das Cabras notou uma movimentação desusada na estrada. Alguns homens limpavam o terreno fronteiriço ao pastinho de suas cabras. Os animais também se assustaram quando viram aqueles homens esquisitos, com uma espécie de cuia na cabeça, alguns em cima de máquinas estranhas, que soltavam muita fumaça por um chifre.


            O Homem das Cabras – que nunca saíra de seu ranchinho, andava descalço, vestia roupas de algodão e comia apenas o que plantava – matutou consigo: “Deve ser gente do governo”. Chegou a pensar até que poderia ganhar um dinheirinho se vendesse queijos para aqueles homens: “Todo mundo gosta de queijo”. Imaginou quantos queijos teria condições de fazer por semana e quanto isso poderia lhe render.


            E assim, depois que punha suas cabras para pastar, o homem ficava a admirar aquele maquinário trabalhando. Dois ou três homens abriam folhas grandes de papel e apontavam para algum lado. E lá ia uma daquelas máquinas a perfurar o lugar.


            Duas semanas depois, o Homem das Cabras e seus animais já estavam enfastiados com aquela barulheira toda. Certo dia, ele ouviu um dos cabeças gritar: “A prospecção falhou. O jeito é levantar âncora”.


O Homem das Cabras não entendeu nada. Só pensou: “Que diabo será isso que ele falou?!”. Os demais homens olharam uns para os outros e seguiram para o acampamento, calados, taciturnos. As máquinas ficaram onde estavam.


            No dia seguinte, ao se levantar, o Homem das Cabras sentiu a curiosidade roer seus miolos. Queria ver o resultado daquela atitude estranha da “gente do governo”. Mal tomou seu café, saiu para levar seus animais ao pastinho. Não achou nenhum animal, nem homens, nem máquinas. Apenas alguns buracos no chão.


            Desolado, o homem olhou o capril sem suas cabras, olhou a estrada erma e gritou bem alto:


            — Ingratas!

 

***



 


ALEXANDRE MARINO



Alexandre Marino

 

 

Álbum de família

 

A bisavó, cansada e insone,

dormita sob o mofo da gaveta.

Seu rosto, maquiado de azinhavre,

esconde-se entre névoas e poeiras,

e sussurra pela metade

as últimas palavras.

 

Um velho de bigodes

sofre de amnésia,

e procura antigo domingo

entre as escleroses de um calendário.

A cidade parece ensolarada,

homens de chapéu diante da igreja

não sabem por que rezam.

 

Nove rostos fitam um tempo de mistérios

estancado no relógio sem corda.

Roupas nos cabides guardam intenções de gestos.

De repente, um silêncio, um ciclone,

e os homens se transformam em estátuas.

 

A cidade, monstruosa,

devasta a terra fértil e as filhas castas,

sufoca sob o asfalto o riacho que a atavia e lava,

envenena aos poucos heróis e canalhas.

 

A cidade parece sombria,

ao amparar etéreas criaturas

entre suas próprias miragens.


*

 

Essa chuva

 

O que faremos com essa chuva

que nos conta histórias

que não queremos ouvir?

 

Essa chuva

que derruba

as árvores que restaram

sobre o campo devastado?

 

O que faremos com essa chuva

que provoca inundações

sobre o asfalto impermeável?

 

O que faremos com as águas

que nos lavam as faces

e exibem o pavor

de nossa fragilidade?

 

Essa chuva

que arruína em minutos

o que não tivemos tempo

de destruir?

 

*

 

O jornaleiro

 

Em memória de Tostão, jornaleiro analfabeto que "lia" com seu vozeirão as manchetes do jornal  Estado de Minas nas madrugadas de Belo Horizonte nos anos 70.

 

  

Todos os dias

o jornaleiro apresenta

o mundo e seus destroços:

delírios de papéis amassados,

esperanças afônicas

do homem incrédulo.

 

O jornaleiro

conta os infortúnios

de um planeta distante e impalpável

ao corpo inerte

sobre o asfalto.

 

Pequenos protestos

em vozes amorfas,

más notícias do paraíso,

um robô humanoide

e seu sorriso.

 

O grito do jornaleiro

vibra no mesmo tom das tragédias

que sem saber vivencia.

 

 *


 

 


MARISE PAXECU




 

1 Plantando Pedras Nesse Mundo de Deuses

 

1.1 Assim caminho com a humanidade

nessa terra que vi

Em minha breve passagem.

Como um viajante, que não pode contar

Com aqueles que estão ao redor,

Pois é visto como um estranho.

 

1.1.1 Esse planeta

Daqui a um milhão de anos

como se sustentará,

Quantas luas terá?

Espelhos ao redor da terra refletirão

a luz solar?

A humanidade,

 Como será?

Terá nariz para ouvir e olhos para cheirar?

Corações nascerão em canteiros,

Fígados e pulmões como flor?

E o amor? E eu? Serei quantas mais?

 

1.1.2 Tudo somos

           Esboço

Delineação inicial de uma obra

Primeira noção de alguma coisa; rudimento

Ação apenas iniciada e logo interrompida;

Tudo somos

Figura indistinta; vulto, sombra;

Resumo; síntese; sumário;

Coisa de milhões de anos e nanos. 

 

1.1.3 Chamam de esboço

O que espremo suco de mim

Mas tudo é assim

Ora é, ora não é

Depende

 

1.1.4 Como um passarim passei

 ... Ei ei ei

E passarei ei ei ei

E volverei ei ei ei

Como uma festa lunar

Poeira de estrela no tempo a vagar


*

 

2 Do Star solitary

 

2.3.3 Certo dia Henfil

Um artista do meu tempo disse que

Alguns de seus conhecidos conterrâneos

Amigos de infância

Depois que ele ficou famoso

Não chegavam mais perto dele.

Ficavam olhando de soslaio,

De longe

Com uma certa indiferença

Nenhum abraço

Nada de entusiasmo

Era como se ele não existisse ali

Enquanto outros que ele nem sabia se aproximavam,

Íntimos, lembrando o que não sabiam

E isso mexia com ele. 

 

2.3.4 As artes todas

Tão belas, tão vazias!

De que servem elas

Nas horas de agonia?

Romance, novela, dança,

Teatro, circo, cinema, TI, música , poesia,

Tudo é feito para o perfeito

Mas o que pode aliviar a dor?

... Às vezes nem elas, nem o amor, o poder, o licor.

 

2.3.5. Em companhia do rádio

Do carro

Da televisão

Da Internet

Da vastidão...

Essa civilização...

 

2.3.6. Na sua frente eu morro e não é pouco não... Choro suor de sangue

Debato pés e coração

 

Você também, vejo que definha ...

Mesmo assim

Não tem piedade

Mesmo assim

Não me domino...

... Essa civilização

Dá-me paura 

 

2.3.7. Às vezes acontece

Às vezes é assim

Em momentos

Quase morremos.

Sofrendo ficamos debatendo em águas rasas

Quando bastaria ficar de pé.

 

2.3.8. Onde estará o anjo que prepara o caminho?

Será uma lenda ou existirá em pele e penas macias?


*


3 da Cura

 

1.2.5 Recolher o animal velho

De forma suave como só o vento pode ser

Esquentar-lhe o corpo

Deitar-lhe azeite cheiroso nas juntas

Passar pomada nas feridas

Respirar devagar

Como se se pudesse curar e aí

Comemorar, 

dançar junto, cantar e celebrar.

Intão!? Vamo começá?!

 

1.2.6 Pajelando vai Pajelando vem

Pajelança cura tamém

Pajelando vai Pajelando vem

Pajelança cura tamém

Cura com água

Cura com folha, raiz, fumaça

Cura cantando, dançando, cuspindo, chorando

Pajelando vai Pajelando vem

Pajelança cura tamém

Caldo quente bem fervido

Dá na boca do oprimido

 com total atenção

Com precisão

Pedra quente na barriga

Sumo verde espremido

Sopro nas ventas

Colar de contas, chocalho comprido

E conexão profunda com o esquecido

Pajelando vai Pajelando vem

Pajelança cura tamém

 

1.2.7 Descobrir os links

Descifrar apliques

Navegar nos trinques.

Urge mesmo o paraíso agora, sem demora.



 

 

ANTÔNIO BARRETO





Linguaral 

 

Língua é o que me falo

Língua-de-trapo língua-de-sogra

Lingua-de-fogo língua-de-praga

Língua que roga e prega

O desconsolo que ora herege

A regra da mensagem

E sacrilege

O tatibitate o papapá o lerolero

Da linguagem

 

Língua-linguagem e versa-vice

O que me aproxima do último

O que me afasta do próximo

O que me traduz do outro

O que outro-de-outro disse

 

A interlocução possível

O impossível da posse:

Os multissentidos do texto

No sentido de que é possível

Perder-se dos sentidos

Quando minha língua esqueço

 

Língua:

A interação do ouço com o vejo o leio

O cheiro do osso no ruído do diálogo

O ruído do diálogo

No osso do contexto

O pescoço de um hipertexto

Na cabeça do objeto

O tronco de uma tela

Num tubo de proveta

As mãos de uma aquarela

Na garganta do poeta

As unhas de uma história

Na memória da RAM-memória

 

Língua:

Antes nunca do que tarde

A forca dos códigos

E a semântica das teias:

Esse olho que não ouve

Esse ouvido que não lê

Essa boca que não cheira

Esse dedo que não pensa

Essa língua que não arde

 

Língua:

Libertas que serás também

Um fotógrafo que não clica

O artista que não queima

Pelos pés da bailarina

Que nos palcos descortina

Sua obra mais ferina:

O salto sobre si mesma

 

Língua:

O holofote dos meus olhos

À procura de uma lesma

Na escuridão das lamparinas

 

Pois íngua é o que me dói na língua

Não na alma

Língua é o que me acalma

Quando amo e digo

Eu te amo

Quando ela quer

Meu verbo fala

Em corpo de cólera:

O terremoto da fala

Minha língua

Minha mulher

 

Língua é o que me come

Como como o quê do onde

O quando do porquê

Do escrível

O que me rondo

O que me soa

Surdo

Nos ouvidos

O que me palavra em signos

O que me troglodita

Rupestremente

Quando não dita

Pelas multidões

 

Língua é o que me rondo

Quando esbarrondo em ondas

De caminhas e cam(nh)ões os ruídos

Barrocos e barrufos

das amídalas de camões

O que me pessoa

O que drummondo

Quando o mundo dorme

Debaixo de um livro

O que guimarães russo roço urro e surro

Sem saber seu uso

E mesmo assim, obtuso,

Me espermaneço vivo

 

Língua é o que me gluto como engulo

O luto do salário bruto e o hálito acre

Do estômago

Em estado dissoluto

 

Língua é o que dissolve e absolve

O pensamento em tais e tais

Palavrares do discurso:

Os sais do fruto os ácidos

Que digestam meu pronome em suco

O adverbo que se veste de aditivo

Substrato de meu cérebro: o muco

O cuspe salivário o intransitivo

Verbicovisualmalemaluco

Que às fezes se faz de glote

Epiglote e faringite

Para a fome da estatite

 

Língua,

Esse necessário árido

Silenciário

Depois do incurso

Quando me sais,

Ó língua, e passeais pelos campos

Gramaticais do lucro

 

Língua é o que me calo

Língua é o que me fere

Língua é o que me infere

Língua é o que me enguiça

 

Língua:

Meu pão-com-ovo

Meu caol, meu prato-feito

Meu angu-de-caroço,

Minha linguiça.


*


Elos perdidos (I)

 

aqui jaz esse meiomem

que vem do peixe findo do mesmomem

esse óssil sapiens renascido

da víscera mais ínfima do míssil

que torna ao pó tudo que já foi pós

fácil físsil fóssil fútil & indivisível

tijolo de tanto barro desperdiçado

 

aqui jaz nosso passado

o resumo do improvável

impossível abismo

que separa o físico do espírito

os séculos dos séculos zipados

num círculo sísmico e físsil

 

antes que cal deuses

assim persas dispersos & assírios

gregos troianos egípcios

desmaias tropincas pastecas

se tornem apenas asseclas

do homem repassado a limpo

 

antes que atlantes se tornem

líquens do ígneo pingo

de pedras conchas sambaquis

(suspiros dos últimos iis),

papiros de re-história e frouxas

fronhas de nossas origens:

o só

osso

roído nosso

de elo pelado

a cor rentado

em pó

 

mas aqui jaz a lesma

a aranha a gosma

a teia a mosca e a língua

fanha

[na panela da cozinha

linguaral as gorduras

da afasia e a banha]

 

a estúrdia ira o pão sovado

[o epitáfio salarial]

 

o dia desossado

na ira da retórica

[a aorta dessangrada]

em sol e sal

 

depois a horta

da recópia

[verbália]

a frigideira

da ovonia

e o malpassado

bife

de nossa

negra

poesia


*

 

Meninal

  

a fruta sobrevoada

sobre a madura tarde

            que formiga

a mosca que estraçalha o vidro

            da lembrança mais antiga:

os sonhos em planta-baixa

o pernilongo sem relógio

            que violava

            a noite sem lógica

a barata liquidada

a pulga cheia de pulgas:

            tudo nessa caixa 

e eu sem sol, sem lua,

            sem chuva

            sem estio

estilingando minhas perguntas

 

para as respostas

de um rio

 


 

SOBRE OS AUTORES

 

 

Alexandre Brandão nasceu em Passos e morou em Belo Horizonte e São Paulo. Desde 1980, vive no Rio de Janeiro. Suas primeiras publicações, três poesias, apareceram no Suplemento Literário de Minas Gerais, na segunda metade da década de 1980. Desde então, participou de oficinas literárias e passou a ser um dos escritores do Estilingues - projeto que já publicou três livros de livre circulação - e, pela Patuá, a coleção Estilingues 30, com um livro de cada um dos participantes. Em 2000, ganhou o prêmio Bolsa do Autor, da Funarte. Tem participação em antologias das editoras Off Flip, Patuá e Pangeia.  Seu primeiro livro, “Contos de homem”, completa em 2025 30 anos. Além dele, são mais oito livros, seis de contos e crônicas e, mais recentemente, dois de poesia: em 2020, “Nenhuma poesia: uma antologia” (Editora Patuá) e, em 2022, “O sol pelo basculante” (Editora Urutau). No próximo ano será lançado, pela Patuá, “Aí onde não cabe”, com duas novelas, uma delas “Zerinho ou um”, que ganhou, em 2022, o 1° Prêmio Literário Flipoços para escritores independentes. Escreve quinzenalmente aos domingos na revista eletrônica de crônica Rubem (rubem.wordpress.com) e mantém o blog No Osso (noosso.blogspot.com).

 

Alexandre Marino nasceu em Passos (MG), morou em Belo Horizonte, onde se formou em Jornalismo, e hoje vive em Brasília. Trabalhou nas redações do Jornal do Brasil, O Estado de S. Paulo e Correio Braziliense, entre outros veículos. Desde a adolescência, sempre fez literatura. Tem oito livros publicados, todos de poesia: Terra Sangria (Editora Penalux, 2022), Hiatos (Editora Patuá, 2017); Exília (Dobra Editorial, 2013); Poemas por amor (Varanda, edição fora de mercado, 2007), Arqueolhar (LGE Editora, 2005), O delírio dos búzios (Varanda, 1999), Todas as tempestades (Edição do autor, 1981) e Os operários da palavra (Batanguera Editora, 1979). Também escreve contos e crônicas. Páginas na internet: https://linktr.ee/alexandremarino

 

Antonio Barreto (Antonio de Pádua Barreto Carvalho) nasceu em Passos

(MG), em 1954.  Ganhou dezenas de prêmios literários importantes como Remington (poesia), Bienal Nestlé de Literatura (poesia), Bolsa Vitae de Literatura (romance), Prêmio Paraná (contos), Guimarães Rosa/Minas de Cultura (romance), Emílio Moura (poesia), Cidade de BH (poesia e contos), Manoel Bandeira (poesia), João-de-Barro (infantil e juvenil), Carlos Drummond de Andrade (poesia), Jabuti (LIJ, didático, contos e várias vezes indicado, em vários gêneros), “Literatura Para Todos” / MEC (crônicas), Internacional da Paz (ONU/Unesco), Ezra Jack Keats (Unicef), IBBY (Unesco).  Entre seus mais de 40 livros publicados se destacam os poemas de O sono provisório (Francisco Alves) e Vastafala (Scipione), os infantis  Lua no varal e Isca de pássaro é peixe na gaiola (Miguilim), os romances A Guerra dos Parafusos (José Olympio) e A barca dos amantes (Lê), as crônicas de  Transversais do mundo (Lê) e O papagaio de Van Gogh (Lê), os contos de Os ambulacros das holotúrias e Reflexões de um caramujo (UFMG) e os infanto-juvenis Balada do primeiro amor e O velho pássaro da lua (FTD). Atualmente prepara por conta própria a edição de SESQUIPEDALIA VERBA (trilogia poética composta pelos livros: Ópera das Máquinas, Urro e Guindaste); Semilábia e Vialáxia: todos premiados nacionalmente desde a década de 1980, ainda inéditos e devidamente recusados pelas melhores casas do ramo).

 

Gilberto Andrade de Abreu nasceu em Passos em meados do século passado. Autor de 13 livros, entre poemas, contos, romances e ensaios acadêmicos. Reside em Ribeirão Preto-SP há mais de quarenta anos. Recebeu vários prêmios, dentre os quais o “Guimarães Rosa de Romance”, concedido pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 1990, além de 11 premiações em festivais de MPB como letrista. É professor de Humanidades e Doutor em Educação pela UNICAMP. Atualmente, prepara dois novos romances que deverão ser publicados proximamente.

 

José dos Reis Santos nasceu em São João Batista do Glória (MG), em 30 de novembro de 1961. Em 1969, mudou-se para a vizinha cidade de Passos, no mesmo Estado, onde reside até hoje. É jornalista e professor de Língua Portuguesa e Redação na rede pública estadual. Já foi premiado em vários concursos nacionais e internacionais. Tem obras publicadas apenas em antologias.


Marco Túlio Costa nasceu em Formiga (MG), em 1955, e reside em Passos (MG), onde fez parte da Revista Protótipo. Possui 23 livros publicados. Iniciou sua vida literária na década de 1970 publicando em suplementos literários e revistas alternativas. Além de contos e romances, tem uma respeitada produção infanto-juvenil, como O mágico desinventor, que tem 24 edições no Brasil e 11 edições no México. Entre os prêmios literários, o “Alfredo Machado Quintela”, da FNLIJ, em 1985; Prêmio Brasília de Literatura, de 1991; Prêmio da Fundação Biblioteca Nacional, em 2012. Neste ano, recebeu o Prêmio Manaus – categoria livro de contos inédito. Recebeu o Prêmio Jabuti, categoria infantil e juvenil, em 2004, além de ser finalista outras quatro vezes.


Marise Pacheco, também Aparecida, nasceu em Passos, Minas, em 1955. Tribal de nascença, participou de grupos teatrais, literários e de comunicação. Entre eles, Jornal O Sudoeste, Gazeta de Passos, revistas Protótipo, Ardeia, em Minas; e Rádio Pirata Clip, teatro Oficina, Grupo Sanguinovo de poesia, e Associação Internacional dos Coleccionadores de Botão, em São Paulo; e coletivo Pombal e Bafão Amazônico, Manaus. Participante da chamada geração de poetas independentes dos anos 80, produziu eventos de arte na rua e publicou e editou poemas em diversos suportes. Entre eles, Passeatas Poéticas, recitais poéticos multimídia, Poemas do Poste, arte postal, cinema de animação, super 8 e produção de vídeos. Editou os livros Imagens, Cutuca Meu Bem Cutuca e Safadinhas. Continua participando de ações e atos poéticos, morando atualmente no Sul de Minas, Guapé.

 

Tassio Lopes é cientista social formado na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), produtor cultural, videomaker e fotógrafo, foi um dos articuladores da rede cultural Fora do Eixo. De 2010 a 2011 foi produtor do Coletivo Goma Cultura em Movimento em Uberlândia (MG), onde produziu eventos periódicos (como o Festival Jambolada e Festival Goma), em 2012 muda-se para Belo Horizonte para ser um dos residentes da Casa Fora do Eixo Minas, gerindo projetos específicos como Circuito Mineiro de Festivais Independentes, Rede Brasil de Festivais e Grito Rock. Neste período, atuou também no Conselho Executivo do site Toque no Brasil, uma rede social para artistas e produtores, focado no mercado da música e colaborou como produtor de conteúdo para a Mídia Ninja. Atualmente atua como midialivrista e produtor cultural em Passos-MG, participa do Movimento Ocupe Estação, que realiza o evento Piquenique da Estação desde 2015, e é articulador do Circuito Cultural Canastra - Rio Grande, uma rede de agentes culturais no sudoeste mineiro.

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