top of page

Dez poemas visuais e verbais de Carlos Barroso

Atualizado: 10 de nov. de 2021


Carlos Barroso




Descorpo



Áfricas


teu corpo

em ouro barroco


tua fé

em Santa

pescada

nas águas


teu gozo

oceânico

das Áfricas



Lugar-comum Vida


1


qu€m ¥a£

nos sal¥ar

da ¥£da?


s€ a ¥£da

¥a£ e re¥£ra


s€mpr€-¥£da

£das, £das

m€nos ¥£ndas

morm€nt€


€x-m€n£na



2


estou com um problema sério

se a vida não me contesta

eu a desespero


se a vida não se repinta

eu a afogo em cloro de piscina

ou mesmo, quiçá, em versos


a vida nunca

foi o que espero

o malogro não sai em capa de revista

nem uma linha

nem em meme

não adianta gritar

Mame!


se a vida não me aborrece

passo a borracha

e não enxergo mais

as suas estrias


nem seus vitrais, bel-prazeres, íris

não me declaro mais à vida

nem quando ela me imita


entre mim e ela

não há pista de cavalo de corrida

apenas um clérigo nulo na missa

apenas um centésimo

do que o olho por olho refina

do que a moça, nua, já deu na vista



ApdoOswald


no

ap

doOs

wald

sefaz

ap

oesia

sefaz

ap

ós

odia

deam

or

ap

ologia




Algum soneto de amor


Não pensar nesse amor como estratégia de fuga ou envergadura


Uma rusga que se coloca na balança de supermercado barato


Vale vintém, decadência, para o vento se esbaforir na montanha


Uma nesga de contentamento frente ao abismo, com seus buracos



Em vão, pois não há, no simulacro, quando se procria, um elo mágico


Tudo é o que se leva, onde se estreita, a sucumbir cada lado


Em que aparecem as mesmíssimas falas, revoam apenas zumbidos


O troco recebido não é, para céu ou inferno, seu pior castigo




Todos os morros foram alamedas; em transe a se desfazer em poeira


Acima do que pensamos, existe um barro que se arvora argila


E que almeja ser a planície, olhares onde ainda resiste vista



Mas é apenas uma cavidade, oca em si, em que se faz silente


Nada soma ao que já estava na conta do desprezo, obra tênue


Ou se insinua acima das correntezas, no horizonte perene







Sumiram os urubus


essa abstração no

vácuo da cidade


acabaram as carniças

ou tudo que se

regozijava


se tornou nenhum, tudo o nada?


o todo-póstumo tomou

para si o nu?


Sumiram os urubus

não significa a

cidade

mais depurada


como se o odor

da carniça

fosse princípio e deserta

causa


Sumiram os urubus


assim se o ciclo da

matéria se abstraísse

e se refugiasse em

um céu estéril, arredio


e se a cidade

se transmutasse em

um Arrudas pútrido e

não no Nilo?


onde, afinal, os urubus esconderam

seus ninhos?


Sumiram os urubus


em que se situa o grande pássaro

da carne e da simbologia do

faminto

uma nave cujo

aeroporto é o que exime o

o podre

entre

o famélico e o desvario


Sumiram os urubus


a cidade já não

tem seu ar

mais ímpio


a não ser que se

entenda a

planilha urbana

entre avenidas

desarborizadas

e o lixão depositário

a réstia do que se

ingere

e a

matéria que cobre

o ríspido


e ali o urubu

imperador a limpo


se colorindo


Sumiram os urubus


alguém pode

dizer se o

céu é o claro

que antecede

o limbo?


mas não pode

ser reclame

do estúpido que se estratifica


do piche que

cobre o solo

tendo o urubu

em todo seu

claronegror


vítima ou desatino?


Sumiram os urubus

agosto/2020




Setembro reescrito


em setembro reescrito

te esperei como

um aluvião corrompido

inocente e assíduo

a mim

em folhas

que voam

à putrefação


em setembro

não vinhas

mesmo não confabulados

em outros contextos

espetáculos

de folhas

ventanias

e um ar de fole

que se expira




Métrica


saibas que sofrer com a métrica

é mais do que sofrer com o sexo

em que se entra e tira a palavra

e ainda falta

1.328 visualizações10 comentários
bottom of page