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Cruz e Souza: as paredes da negação por Anelito de Oliveira

Atualizado: 10 de nov. de 2021


Retrato do poeta Cruz e Sousa, pintado por Willy Zumblick, 1960. Acervo: Museu

Histórico de Santa Catarina.



Com sua feição de memorial de trajetória poética, tentando apresentar motivações externas e internas da conformação estética da obra, “Emparedado” revela elementos para a compreensão do modo como significa grande parte do que o autor escrevera nos anos 1890. Sem dúvida, a intenção memorialística é o que torna esse texto, já tão explorado por uma longa tradição crítica em que se ressaltam autores como Roger Bastide (1979, p. 159) e Alfredo Bosi (1994, p. 271-272), ainda mais significativo para a operacionalização das questões visadas por este estudo. Em virtude dessa intenção, pode-se constatar, primeiramente, que o que se encontra no “Emparedado” não procede apenas do externo, em que se situa Cruz e Souza, nem apenas do interno, em que se situa o eu lírico, digamos. O que se encontra ali procede, simultaneamente, dos dois planos, não em função de um consenso entre ambos, mas antes de um dissenso, de um conflito que, necessariamente, atua sobre a forma, contribuindo, inclusive, para a decisão sobre a natureza dessa forma.


Evidente que “Emparedado”, como tantas outras prosas do autor, é atravessado por elementos típicos dos “poèmes en prose” simbolistas, conforme explorado por Luiz Silva (1999) e Marie-Hélène Catherine Torres (1988), mas o que o move, fundamentalmente, é um desejo ensaístico, de um pensar lúcido, configurando-se uma espécie de poema-ensaio. Como tal, procura explicitar uma verdade, mas poeticamente, à maneira dos românticos alemães, sem negar o lugar de poeta do seu autor, o que torna essa verdade ainda mais candente, mais intensa. “Emparedado” não é apenas enunciado (algo resultante, por isso mesmo, de um processo de enunciação), mas também a enunciação em si, logrando aproximar, portanto, passado e presente de uma mesma situação discursiva. Lendo-o, pode-se perceber, num mesmo movimento, o que levou a obra a ser e o que ela já está sendo exatamente porque passado perfeito e presente progressivo estão localizados num mesmo espaço, num mesmo corpo, num mesmo suporte, portanto. Dir-se-ia que o que garante a unidade da obra é justamente o fato de seus tempos diferentes remeterem a um espaço comum, de suas ocorrências convergirem em direção a uma mesma instância, qual seja: a da letra, a da matéria, a do desvio.


Com “Emparedado”, vemos que essa convergência não corresponderia a uma pensada estratégia discursiva, a algo efetivado em função de um desejo de Cruz e Souza ele mesmo, mas antes a uma fatalidade cognitiva, digamos, a algo que se impõe ao processo de conhecer como que a demarcar o limite mesmo de um conhecimento e, por conseguinte, de um dizer. Noutros termos, não é por um mero desejo de coerência temática que a obra sousiana, a despeito de inevitáveis metamorfoses ao longo da trajetória do autor, converge em direção à letra, naquele sentido de Lei tensionado por Agostinho de Hipona (1998), mas porque, de fato, não há outra alternativa. Tudo se passa como se, atingindo um determinado estágio do processo de conhecer, o sujeito da cena de conhecimento se visse obrigado a retroceder por ali já estar experienciando, com a consciência possível, uma situação de revel, desobedecendo a lei, a letra, o código, enfim, o contrato sociocultural. Ali onde o sujeito efetivaria, finalmente, o conhecimento e consequente enunciação daquilo que deseja, erguem-se as paredes, soa a voz da letra, conferindo a esta um claro estatuto de negação:


Não! Não! Não! Não transporás os pórticos milenários da vasta edificação do Mundo, porque atrás de ti e adiante de ti não sei quantas gerações foram acumulando, acumulando pedra sobre pedra, pedra sobre pedra, que para aí estás agora o verdadeiro emparedado de uma raça.

Se caminhares para a direita baterás e esbarrarás ansioso, aflito, numa parede horrendamente incomensurável de Egoísmos e Preconceitos! Se caminhares para a esquerda, outra parede, de Ciências e Críticas, mais alta do que a primeira, te mergulhará profundamente no espanto! Se caminhares para a frente, ainda nova parede, feita de Despeitos e Impotências, tremenda, de granito, broncamente se elevará ao alto! Se caminhares, enfim, para trás, ah! Ainda, uma derradeira parede, fechando tudo, fechando tudo – horrível! – parede de Imbecilidade e Ignorância, te deixará num frio espasmo de terror absoluto...

E, mais pedras, mais pedras se sobreporão às pedras já acumuladas, mais pedras, mais pedras... Pedras destas odiosas, caricatas e fatigantes Civilizações e Sociedades... Mais pedras, mais pedras! E as estranhas paredes hão de subir, – longas, negras, terríficas! Hão de subir, subir, subir mudas, silenciosas, até às Estrelas, deixando-te para sempre perdidamente alucinado e emparedado dentro do teu Sonho... (Souza, 1995, p. 673)



Pressupondo esta voz, naturalmente, um corpo, um compartimento de onde ela emerge, não parece razoável dizer que se trata pura e simplesmente daquele corpo da sociedade racista da época. Trata-se dele, especialmente, mas não só, pois nessa sociedade, sob a égide de uma mesma atmosfera cultural, em meio à dinâmica que envolve toda a coletividade, encontra-se também Cruz e Souza. O que soa aqui, por isso mesmo, deve ser atribuído tanto a um plano quanto a outro, tanto ao plano social quanto ao individual, o que justifica, em grande parte, o tom exaltado, aterrorizado, que remete diretamente ao sujeito, evidenciando a confusão entre corpos e vozes de que, a propósito de Rimbaud, falou Jacques Rancière (1995, p. 141-168). Ora, enuncia-se algo, num tom que pouco se distingue da tonalidade geral do texto, que pertence, sobretudo, a uma outra voz, à voz geral da sociedade, algo de que o sujeito, aquele que constitui “o suporte de um processo de verdade”, conforme a compreensão de Alain Badiou (1994, p. 110-111), evidentemente, discorda, pois que o condena a não ser, a malograr-se em seu projeto de ser.


O que soa nestes parágrafos finais do texto é e não é, ao mesmo tempo, o que se quer dizer: é o que se quer dizer a partir da sociedade e é o que não se quer dizer a partir do autor, ou pelo menos não se quer tanto dizer a partir do autor. Assim se processa em virtude do fato de que não há autonomia do corpo da voz em relação ao corpo social exatamente porque o autor se perfaz em relação difícil com esse corpo, sem dele poder prescindir, pois nele está imbricado. Esse autor, segundo a ordem que embasa o corpo social, constituiria justamente aquilo que não pode ser, um desejo impossível, uma diferenciação – e assim se mostra a “função autor” em sua complexidade desdobrada por Michel Foucault (1992, p. 50; 2000, p. 9-54), com seu escopo societário controlador – ousada por aquele permitido apenas como generalidade, coisa entre coisas, Cruz e Souza ele mesmo, situação crítica indicada, em termos fenomenológicos, pelas aspas nos parágrafos finais de “Emparedado”.


Pode-se compreender essas aspas, a partir dos pressupostos de Edmund Husserl (1992), como acusação, pela via da “redução eidética”, do que seria a “tese natural do mundo” histórico, como posição (thésis) racista que se apresenta na cotidianidade, com a qual o sujeito discorda, evidentemente, e, se está a lidar com ela, é apenas para atestar sua inconsistência. Quando, como resultado mesmo da ousadia do indivíduo, aquilo que não pode ser (o autor) insiste em ser, apresentam-se, como fim de cena, as paredes, figuradas como que uma espécie de barra elástica a se estender insistentemente, a se multiplicar como resposta automática à força que sobre ela atua. Pode-se mesmo dizer que o aumento da barra é proporcional à insistência, por parte de quem escreve, em vir a ser autor, em ser aquilo que não pode ser. Esta insistência há de lhe custar, ao final do processo, o emparedamento no âmago do próprio Sonho, modo de enunciar que, naturalmente paradoxal em relação à “idea”, no sentido elucidado por Erwin Panofski (2000), como princípio formal que orienta a criação artística, que subjaz ao texto, amplia decisivamente o horizonte de significação do “Emparedado”.


Pode-se encarar como destoante o emparedamento no próprio sonho, compreendido, obviamente, como dimensão interior, mas em face da enunciação que o poeta dá a ver, a fim mesmo de acusar sua produtividade, pode-se aceitar a possibilidade de que o sujeito já põe em relevo uma compreensão mais categórica de sonho, qual seja, aquela que está no horizonte de Sigmund Freud (1987, p. 604), tal como aparece sintetizada no seu texto “Sobre os sonhos”, escrito em 1901, poucos meses depois da publicação de A interpretação dos sonhos em 1900, portanto. “Uma vez que reconheçamos que o conteúdo do sonho é a representação de um desejo realizado”, diz Freud como que respondendo àqueles que têm um entendimento comum sobre o sonho, “e que sua obscuridade se deve a alterações feitas pela censura no material recalcado, não mais teremos qualquer dificuldade em descobrir a função dos sonhos.”

O desdobramento semântico do “Emparedado” – a condenação ao isolamento no próprio Sonho – só é possível numa instância cultural em que dizer sonho já não implica dizer o contrário da realidade, tampouco afirmar algo exclusivo de um indivíduo, de um sonhador. Implica, na verdade, dizer um complemento da realidade e, por conseguinte, afirmar a radicação da experiência individual na esfera coletiva, num solo comum: o emparedado no próprio Sonho, desta forma, não é parte alijada do todo, definitivamente expurgada, mas tão-somente o recalcado, a dimensão que se mantém em surdina numa sociedade. Assim se explica o fato de que, mesmo estando barrado, cerceado pelas paredes, mesmo experienciando a condição de emparedado, o sujeito diz, ação através da qual se afirma como participante da cena enunciadora, como parte, digamos, do todo dizível. De fato, para que o Sonho em questão se nos apresentasse como um outro lugar, completamente estranho à coletividade, acessível apenas ao indivíduo, seria necessário um silêncio do sujeito, mas este fala abundantemente como que numa resistência ao silenciamento imposto pelos “discursos dominantes”, para lembrar uma vez mais Bosi (1990, p. 141-192), aos poetas modernos desde o Pré-Romantismo, uma resistência que se dá com o próprio silêncio tantas vezes em Cruz e Souza, como se percebe em Broquéis e Faróis. Vemo-nos, por isso mesmo, em face do “Emparedado”, na iminência de avançar até uma compreensão outra da metáfora da parede, do impedimento, enfim, da barra, daquilo comumente identificado como o que separa dois compartimentos: indivíduo e coletividade, significante e significado.


“Emparedado”, em função de influxos da época, move-se no sentido de fundamentar a discórdia entre o artista negro Cruz e Souza e a sociedade brasileira, cristalizando-se a metáfora da parede como imagem terminal dessa relação dilaceradora que a tradição crítica sociologizante sempre teve dificuldade de interpretar, chegando não raro a reducionismos contraproducentes, como o de Nelson Werneck Sodré (1964, p. 458). Entre uma e outra dimensões, entre o individual e o social, paredes que, todavia, são ostensivamente discursivas: à direita, “Egoísmos e Preconceitos”, à esquerda, “Ciências e Críticas”, à frente, “Despeitos e Impotências” e, atrás, “Imbecilidade e Ignorância”. O fato de serem, obviamente, camadas discursivas é que confere a essas paredes uma ambivalência no sentido da relação, ambivalência que se nos afigura como índice da complexidade dessa relação: relacionam-se, simultaneamente, com o artista e a sociedade, afigurando-se-nos como aquilo que os separa, mas também os aproxima inevitavelmente, como ponto-de-encontro, portanto, que exibe o eu tal como postulado por Sören Kierkegaard (1979, p. 33-35), isto é, como uma relação “que não se estabelece como qualquer coisa de alheio a si, mas consigo própria.”

O desespero aflora no “Emparedado” porque, nos termos do filósofo dinamarquês, “o eu consiste no orientar-se dessa relação para a própria interioridade”, revelando-se, no limite, o “voltar-se sobre si própria” da relação, “o conhecimento que ela tem de si própria depois de estabelecida”. Sem dúvida, é mais natural (por isso mesmo frequente) a abordagem da parede como metáfora de separação, o que se explica pelo privilégio do ângulo discursivo em detrimento do perceptivo na análise do texto: “Emparedado” como evento de dizer, como cena em que se escreve, mais ainda, como confissão desesperada de um negro, não como evento de ver, como cena em que um sujeito contempla, externa uma micro-história de sua percepção. Neste ponto, três dados são fundamentais para a reconsideração crítica do “Emparedado” de uma perspectiva epistemológica, enquanto cena de conhecimento sobre a experiência histórica de alteridade: evento, contemplação e percepção.

Alain Badiou (1996, p. 147-158) entende que um evento é algo irredutível à situação, uma singularidade “fora-da-lei”. Detalhando esse conceito, diz:


Um evento é sempre localizável. Que quer dizer isto? Primeiro que nenhum evento diz respeito imediatamente à situação em seu conjunto. Um evento está sempre num ponto da situação, o que quer dizer que ele ´concerne´ a um múltiplo apresentado na situação, seja qual for o significado da palavra ´concernir´. É possível caracterizar de maneira geral o tipo de múltiplo que pode ´concernir´a um evento, numa situação qualquer. Como se poderia prever, trata-se do que pré-nomeei um sítio eventural (ou na borda do vazio, ou fundador). Estabelecemos de uma vez por todas que não há evento natural, nem tampouco evento neutro. Nas situações naturais ou neutras não há senão fatos. A distinção entre o fato e o evento remete, em última instância, à distinção entre as situações naturais, ou neutras, cujo critério é global, e as situações históricas, cujo critério (existência de um sítio) é local. Não há evento senão numa situação que apresente ao menos um sítio. O evento está preso, em sua própria definição, ao lugar, ao ponto, que concentra a historicidade da situação. Todo evento tem um sítio singularizável numa situação histórica.



Pensando no “lance de dados” de Mallarmé, diz ainda Badiou:



O evento de que se trata em Um lance de dados... é, portanto, a produção de um símbolo absoluto do evento. O que está em jogo no lançar dados ´do fundo de um naufrágio´ é fazer evento do pensamento do evento. (...) Senão vejamos: sendo a essência do evento ser indecidível quanto a sua pertença efetiva à situação, um evento cujo conteúdo é a eventuralidade do evento (e o lançar dados ´em circunstâncias eternas´ é precisamente isso), não pode, por sua vez, ter por forma senão a indecisão. Uma vez que o mestre deve produzir o evento absoluto (aquele, diz Mallarmé, que abolirá o acaso, sendo o conceito ativo, realizado, do ´há´), ele deve fazer pender essa produção de uma hesitação ela mesma absoluta, em que se indica que o evento é esse múltiplo do qual não podemos saber, nem ver, se ele pertence à situação de seu sítio”. (aspas e grifos do autor).


À medida que contempla, o sujeito que existe nesse evento revela sua fidelidade à dimensão mística, que, como postula María Zambrano (1996, p. 47-71), ao refletir sobre a relação entre mística e poesia, desentranha-se do universo platônico, tendo como característica o estado contemplativo, como se vê no Timeo, por exemplo. Nesse diálogo, segundo a filósofa, o conhecimento se mostra como purificação, libertação da alma e consequente reintegração à natureza. Ali o “saber desinteressado” resulta no mais profundamente interessado de todos os saberes, que faz com que a alma se afirme como ser, de modo que, ao final do processo, aquele que contempla se torna semelhante ao objeto de sua contemplação. Em virtude da dimensão mística caracterizar esse evento de contemplação é que se coloca a complexidade da percepção, que pensamos a partir de Maurice Merleau-Ponty (2004, p. 56-57) de reflexões como, por exemplo, “A arte e o mundo percebido”, resultado de conferência pronunciada em rádio em 1948:


O que aprendemos de fato ao considerar o mundo da percepção? Aprendemos que nesse mundo é impossível separar as coisas de sua maneira de aparecer (...) se sigo a escola da percepção, encontro-me pronto para compreender a obra de arte, porque esta é também uma totalidade tangível na qual a significação não é livre, por assim dizer, mas ligada, escrava de todos os signos, de todos os detalhes que a manifestam para mim, de maneira que, tal como a coisa percebida, a obra de arte é vista ou ouvida, e nenhuma definição, nenhuma análise ulterior, por mais preciosa que possa ser posteriormente para fazer o inventário dessa experiência, conseguiria substituir a experiência perceptiva e direta que tive com relação a ela.


Está bastante claro, já na abertura do “Emparedado”, que o sujeito situa-se num “locus” de contemplação, que seu dizer ali radica numa ação de contemplar, de maneira que compreender esse poema em prosa radicalmente, na acepção primeira do termo, implica considerar o movimento perceptivo que o engendra:


Eu ficara a contemplar, como que sonambulizado, como o espírito indeciso e febriciante dos que esperam, a avalanche de impressões e de sentimentos que se acumulavam em mim à proporção que a noite chegava com o séquito radiante e real das fabulosas Estrelas.

Recordações, desejos, sensações, alegrias, saudades, triunfos, passavam-me na Imaginação como relâmpagos sagrados e cintilantes do esplendor litúrgico de pálios e viáticos, de casulas e dalmáticas fulgurantes, de tochas acesas e fumosas, de turíbulos cinzelados, numa procissão lenta, pomposa, em aparatos cerimoniais, de Corpus Christi, ao fundo longínquo de uma província sugestiva e serena, pitorescamente aureolada por mares cantantes. Vinha-me à flor melindrosa dos sentidos a melopéia, o ritmo fugidio de momentos, horas, instantes, tempos deixados para trás na arrebatada confusão do mundo.

Certos lados curiosos, expressivos e tocantes do Sentimento, que a lembrança venera e santifica; lados virgens, de majestade significativa, parecia-me surgirem do suntuoso fundo estrelado daquela noite larga, da amplidão saudosa daqueles céus... (grifo do autor) (Souza, 1995, p. 659)


Caracteriza-se aqui o contemplador como sonâmbulo e, numa progressão quase previsível, como espírito, para que, finalmente, possa se enunciar o objeto de sua contemplação. Esse objeto, por sua vez, não é mais que um vir-a-ser, aquilo que ainda há de se constituir, o esperado por aqueles que, como o próprio contemplador, estão habituados a esperar. Não é possível dizer que a constituição desse objeto se dê objetivamente ao longo do “Emparedado”, considerando-se que o objeto em questão não é, de forma alguma, Cruz e Souza, pois este se mostra, como nunca, sujeito ou, no mínimo, “subjetile”, híbrido de sujeito e objeto, que não é nem um nem outro exclusivamente, conforme que Jacques Derrida (1998, p. 23) problematiza em Artaud. Como tal, é confuso, mas não porque quer, como resultado de uma estratégia discursiva, ou porque seja próprio do sujeito moderno a confusão, a condição de crise, sendo mesmo plausível entender que ele não quer ser confuso, que é movido por uma vontade de se revelar ordenado. Esse sujeito é confuso porque se localiza numa cena de percepção, porque se dá ao ato de ver, e não é possível controlar de todo a percepção, pois que essa não se processa apenas de uma parte para outra, daquele que se põe a ver para aquilo que está sendo visto, de uma “noesis” para um “noema”, nos termos da Fenomenologia de Husserl (2001, p. 16).

O que se expõe no “Emparedado” é antes uma impossibilidade de percepção clara daquilo que se quer sinalizar, que se quer transpor para o âmbito estético de maneira intensa, como gritante verdade. Nesse texto, em que o desejo sousiano de dizer categoricamente atinge seu ápice, observa-se um latente desentendimento entre percepção e sinalização, ponto em que se localiza o “agon”, o conflito essencial que repercute dramaticamente, como não poderia deixar de ser, na superfície do poema. A colocação deste problema se revela bastante produtiva à luz das reflexões que Georg Lukács (1967, p. 8-76) apresenta em sua Estética sobre o sistema de sinalização, de produzir significados, tomando como ponto de partida considerações de Pavlov, segundo as quais os animais, até o advento do Homo Sapiens, tinham nas impressões os únicos sinais do mundo circundante, que seriam os sinais de primeira ordem. Com o aparecimento do homem, surgiram os sinais de segunda ordem – palavras faladas, ouvidas e visíveis – que seriam, portanto, sinais de outros sinais primeiros, aqueles dos animais. Com esses novos sinais, os homens passaram a designar tudo que percebiam imediatamente, tanto do mundo externo quanto do interno.

A consequência desse processo, cujo tensionamento interessa especialmente a Lukács, é a postulação por Pavlov de uma divisão dos homens em três tipos: um artístico, um pensador e um intermediário. O tipo artístico, de que Tolstoi seria um exemplo, estaria no mesmo nível dos animais por basear-se, segundo Pavlov, no primeiro sistema de sinalização. Lukács discorda de que o artista, a criação e fruição da arte sejam reflexos condicionados e convoca a questão do trabalho a partir de Engels – para quem, pressupondo um domínio da natureza, o trabalho ampliara o horizonte do homem – e Ernst Fischer, para quem a relação sujeito-objeto nasce exatamente com o advento do trabalho. A partir da consideração da vinculação entre a linguagem, o sistema de sinalização e o trabalho, Lukács amplia o ponto de vista de Pavlov, trabalhando com a possibilidade de sinais que são sinais de outros sinais em virtude da proximidade dos sistemas na dinâmica social impulsionada pelo trabalho.

À medida que o que se coloca em questão no “Emparedado”, o que se elege como problema, não é a forma drama, tampouco a forma poema, mas algo como poema-ensaio, conforme aludido, faz-se necessário um desvio da máscara – aparência, encenação, literatura, representação etc – e encontro com o rosto mesmo, com vistas a apreender aquele plano em que se processa, ainda sem contornos definidos, a significação vinculada à problemática da percepção, tal como, numa proximidade humanista, digamos, com Lukács, pode-se perceber em Merleau-Ponty. Pode-se pensar no rosto nesse processo a partir de duas referências: a de Gilles Deleuze e Félix Guattari (1996, p. 31-61), que veem nessa superfície uma atividade concernente ao significante, que constitui “o muro do significante”, e a de Emmanuel Lévinas (1993, p. 55-60), para quem “o fenômeno que é a aparição do Outro, é também rosto”. Lévinas, aprofundando a questão da alteridade, entende “o Outro que se manifesta no rosto perpassa, de alguma forma, sua própria essência plástica, como um ser que abrisse a janela onde sua figura no entanto já se desenhava”. Assim, pode-se dizer que, aquém da máscara, no rosto, apresenta-se outro ângulo para a compreensão do “Emparedado”, a partir do qual há plausibilidade em pensar esse texto como cena de ver, não mais apenas como cena de dizer: o ato de ver como algo que precede o ato de dizer, de tal modo que não é possível compreender o segundo sem referência ao primeiro.

O plano em que a significação se processa, conforme o trecho destacado no tópico anterior, não parece ser outro senão a noite, único ente externo que, da perspectiva do contemplador, chega, “ocorre”, no sentido wittgensteiniano, o que se deve justamente à função decisiva que desempenha no ato de perceber levado a efeito. Se o que ocorre é o mundo, como se pode depreender do Ludwig Wittgenstein (1968, p. 55) do Tractatus (“Die Welt ist alles, was der Fall ist”), o mundo é noite para o sujeito da percepção, de tal forma que se pode pensar que o mundo-noite percebido é “a totalidade dos fatos, não das coisas”, é um mundo “determinado pelos fatos” que o complicam. O sujeito percebe através da noite, através de uma instância que não lhe permite perceber claramente, que trava, tal como um sonho-parede, seu olhar, fazendo com que retroceda no mesmo passo que avança. Desse modo, o campo exterior ao sujeito, nunca apreendido objetivamente, acaba por não se configurar, restando apenas como potência, virtualidade. “Emparedado” é exemplar de uma natureza unívoca da obra sousiana e, se parece algo eminentemente dialógico, é porque ostenta uma maneira estranha de univocidade, qual seja, uma univocidade rasurada, insuficiente, incompleta, que incita uma ilusão de polivocidade. O que ali se encontra não é, sem dúvida, um colóquio, uma cena em que muitos dizem, mas antes um solilóquio, um “querer-dizer”, que caracteriza a “expressão”, conforme Derrida (1994, p. 40-46) pensa a partir de Husserl, o desdobramento de uma mesma voz, tal como se constata num ponto decisivo do texto:


E é por isso que eu ouço, no adormecimento de certas horas, nas moles quebreiras de vagos torpores enervantes, na bruma crepuscular de certas melancolias, na contemplatividade de certos poentes agonizantes, uma voz ignota, que parece vir do fundo da Imaginação ou do fundo mucilaginoso do Mar ou dos mistérios da Noite – talvez acordes da grande Lira noturna do Inferno e das harpas remotas de velhos céus esquecidos, murmurar-me. (Souza, 1995, p. 672)


Essa voz desconhecida é que externa, como se sabe, a ideologia racista da época, que reproduz o primado bíblico da escravidão, que desclassifica a África, que nega a possibilidade de um artista de origem africana etc. Não é, certamente, por uma gratuidade discursiva que essa voz murmura, mas porque é voz rasurada, porque não se trata de definida voz do outro, mas de indefinida voz do mesmo, voz cuja fonte localiza-se naquele que diz, embora seu conteúdo não corresponda, evidentemente, ao que o sujeito pensa. Claro, aqui se coloca o paradoxo de se dizer, com a própria voz, aquilo que não se pensa efetivamente, o que se explica, fora do mascaramento literário, em virtude de a noite se interpor entre a percepção e a sinalização: o que se diz, o conteúdo da sinalização, contradiz o que se pensa, numa demonstração de que o sujeito está barrado pela noite, impossibilitado de distinguir o que lhe é idêntico do que lhe é diferente. Esta impossibilidade de distinção pode ser pensada como demonstração da dificuldade que Martin Heidegger (1991, p. 139-147) acusa a respeito da compreensão da identidade ao longo da história do Ocidente, dificuldade que radica na incompreensão do que os gregos antigos entendiam por “tò autó”, o idêntico, o mesmo.

Categoricamente, pode-se dizer que o sujeito que se apresenta no “Emparedado” não pensa, à medida que não se ocupa de discernir o que diz, mas de apenas dizer, com o que se realça a primazia do perceber sobre o sinalizar, este figurando como algo secundário. Noutros termos, o que realmente importaria, para o autor, é o drama da percepção, a impossibilidade de perceber totalmente, o que o conteúdo da sinalização apenas confirmaria, fato que exige esclarecimento. A experiência de audição do “Emparedado”, de leitura atenta à sensação do que se diz, tende a incomodar exatamente porque o que se ouve não parece corresponder a tudo aquilo que o sujeito que ali fala deseja dizer, como se seu desejo realmente excedesse a possibilidade de verbalização da linguagem. Revela-se uma situação em que esse sujeito parece estar localizado num ponto em que dizer totalmente já se tornara algo impossível, como se estivesse definitivamente fadado a dizer apenas uma parte do que quer dizer, imperativo que o contraria fundamentalmente, pois que seu projeto é, neste fim de linha criativa, dizer não apenas o dizível, mas, sobretudo, o indizível. Este, por sua vez, corresponde, ainda nos termos da reflexão de Wittgenstein (1968, p. 279), a uma acusação do “sentimento do mundo como totalidade limitada” que constitui, no limite, o “sentimento místico”, aquilo que só se pode mostrar, não dizer, conforme explorado com agudeza por Ramón Xirau (1975, p. 107-115).

Todavia, esta constatação resulta, naturalmente, do conteúdo que se dá à leitura: é em função do que se diz que se torna possível inferir um limite do dizer no poema, duvidar de que o que se diz corresponda realmente ao que o sujeito quer dizer – não, obviamente, ao que ele quis dizer, pois que o texto, de todo modo, caracteriza-se como ato, configura uma ação de dizer, portanto. Deriva da profundeza do “Emparedado” o sentido de que o sujeito quer dizer ele mesmo, quer sinalizar-se, sentido que não se confirma na superfície do texto como comprovação, exatamente, de uma impossibilidade de figuração total, no âmbito da sinalização, daquilo que está radicado no âmbito da percepção: o que se percebe, dilui-se no ato de dizer. Ao evocá-la como musa, “Emparedado” dá margem para que se reconheça no elemento noite uma função mediadora no processo de percepção, conforme aludido, mas, o que é mais significativo, também um poder de decisão: o que é, no que se dá a ler, só o é com a noite, de tal forma que se pode inferir que isso que é, que agora é na duração da leitura, não seria assim sem a noite, não se podendo descartar, por outro lado, a possibilidade de que isso que é pudesse ser diversamente do que está sendo, pudesse efetivar-se com outra figuração, sem o consórcio da noite. Dir-se-ia, a princípio, que a noite decide o que é exatamente porque media a percepção, porque se interpõe entre o que o sujeito vê e o que o autor escreve, o que significaria dizer que a função da noite tem primazia em relação ao seu poder, resumindo-se a questão de maneira mecanicista.

Tanto o fato de mediar quanto de decidir sobre o sentido do “Emparedado” só confirmam a noite como plano em que a significação se processa, rosto em que inúmeros contornos se imbricam, instância naturalmente confusa. Claro, nessa instância, letra e espírito – o que mata e o que vivifica, a realidade e a idealidade, a ordem histórica e a “desordem” estética etc – estão em confronto, situação que atravessa a letra sousiana, a essência do seu significante, donde resulta, em última análise, a imagem de um ser atormentado, não do próprio ser, já que se trata de texto com intenção rememorativa. O ser mesmo atormentado encontra-se, com efeito, nos Últimos sonetos, em textos como “Vida obscura” e “O assinalado”, em muitos poemas de Faróis, como “Tédio” e “Olhos do sonho”, e mesmo em outros textos de Evocações, de que faz parte “Emparedado”, como “Iniciado” e “A noite”.


“Emparedado” permite a compreensão de que, para Cruz e Souza, esse tormento do ser se deve a uma experiência da noite como movimento fundamental para um devir-artista, que não raro se confunde com um devir-humano: ser artista como equivalendo a ser dotado de humanidade. O tormento se deve precisamente ao fato de que, ao atravessar a noite, o ser vivencia um processo de transformação, de aquisição de um outro modo de ser, de uma diferenciação, portanto, daquilo que até então estava sendo, vivencia um processo de deixar de ser para ser o que ainda desconhece. O fato de se situar na noite, de implicar uma experiência da noite, inscreve esse tormento no horizonte da mística de San Juan de la Cruz, conforme elucidado por Roger Bastide (1979, p. 175-176), mas, por outro lado, a falta de uma progressão nessa experiência, sua natureza tautológica, revela uma espécie de dificuldade de realização mística no sentido estritamente religioso, de união efetiva da alma com seu “esposo”.

Se, retomando o Livro de Tobit da Bíblia de Jerusalém (1981), o místico preconiza sua noite como sendo, de fato, três em uma, a do poeta se revela como sendo apenas uma, em que o ser se agita num permanente mal-estar, como se observa principalmente nos sonetos, configurando-se a imagem de sua limitação. Esta imagem, evidentemente, pode ser tomada como comprovação de impossibilidade de transcendência do ponto de vista espiritual, mas como a transcendência possível do ponto de vista textual – percepção do ponto ali onde não se pode dizer:


Fiquei como a alma velada de um cego onde os tormentos e os flagelos amargamente vegetam como os cardos hirtos. De um cego onde parece que vaporosamente dormem certos sentimentos que só com a palpitante vertigem, só com a febre matinal da luz clara dos olhos acordariam; sentimentos que dormem ou que não chegaram jamais a nascer porque a densa e amortalhante cegueira como que apagou para sempre toda a claridade serena, toda a chama original que os poderia fecundar e fazer florir na alma...

Elevando o Espírito a amplidões inacessíveis, quase que não vi esses lados comuns da Vida humana, e, igual ao cego, fui sombra, fui sombra! (Souza, 1995, p. 660-661)

O ponto onde não se pode dizer, como está bem claro aqui, é exatamente onde aquele que deseja ver, não pode fazê-lo, acometido que é pela cegueira, com o que se afirma a dependência fundamental do dizer em relação ao ver. Chega-se a esse ponto em virtude da elevação do espírito até a instância previamente sabida como inacessível, donde não é possível discernir o dado humano e, consequentemente, o sujeito da percepção converte-se em sombra, equiparada ao cego. Todavia, tendo-se em vista que sombra atualiza noite, pode-se dizer que o sujeito se converte exatamente naquilo que ele também está, que é seu onde, logo: a elevação do espírito o iguala ao cego como sombra, naturalmente igualada a noite.

Daí se explica por que no cego há tormentos, flagelos e sentimentos que esperam para ser despertados pela luz dos olhos: trata-se de um cego-sombra-noite, um compartimento, uma limitação, enfim, uma instância barrada. O sujeito, cuja “via-crucis” é recordada pelo “Emparedado”, encontra-se, na sua fase final, exatamente confinado nessa instância, barrado, sem poder ver para fora de si mesmo, ensimesmado, enfim. Dessa situação procede o que se apresenta de maneira confusa, obscura, na superfície da obra sousiana, precisamente a partir de Faróis, um comportamento de linguagem antecipado em alguns poemas de Broquéis e levado às últimas consequências nos Últimos sonetos. Nestes, em virtude de toda essa complexidade aqui descortinada, a questão já não poderia mesmo ser a de exprimir uma significação, mas sim a de assinalar no corpo do texto a impossibilidade de significar o que se espera, de corresponder a uma expectativa já definida de significação.



Referências



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