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Foto do escritorRevista Sphera

Editorial Sphera 3: tecer outra rede dentro da rede

Atualizado: 1 de jan.

Poema de Guilherme Mansur, uma das maiores referências da poesia contemporânea. Foto: Divulgação/Internet

Tecer outra rede de relações sígnicas 


Chegamos ao número 3 de Sphera. Não foi fácil. O número 3 de uma publicação é sempre o mais difícil. Sabemos bem. Grande parte das publicações periódicas independentes naufraga no número 2, quando não no número 1.  As dificuldades são muitas, de todos os tipos e tamanhos. A nova ordem digital não alterou totalmente uma situação comum à tradição dos impressos. Mudaram-se os processos editoriais, mas seus fundamentos continuam. Estes são tanto de ordem objetiva quanto subjetiva. Editar continua sendo trabalho árduo com suas várias camadas: organização de equipe de produção, definição de temas e cronograma de produção, agenciamento de produtores de textos, leitura e normatização de textos, pré-edição, revisão, diagramação, publicação, distribuição, pós-edição. As facilidades indubitáveis do digital não são suficientes para, sobretudo, garantir a qualidade de nenhuma publicação. A questão não é só jogar na rede, é muito mais tecer uma outra rede de relações sígnicas dentro da rede. Sphera é signo de circularidade, de encruzilhamento, de exuzação do caráter planista da rede. Basta isso para justificar, pois, toda a demora para a construção desse número, que só se fechou no último dia do ano.

Destacamos neste número dois dossiês. Um sobre o poeta ouropretano Guilherme Mansur, que nos deixou no último dia 27 de setembro aos 65 anos. O segundo dossiê é sobre escritores da cidade mineira de Passos, localizada no sudoeste de Minas Gerais, que vivem em outras cidades do país, configurando-se uma espécie de diáspora passense. São destaques diferentes unificados por uma mesma geografia geral mineira e também pelo tom celebrativo. Celebramos, em ambos os casos, a vida de poetas e prosadores responsáveis pelo fervor da cena poética nos anos 1970 e 1980, que criaram ou participaram de publicações literárias, que resistiram à repressão nos anos de chumbo, que contribuíram, de modos e em graus diversos, para a redemocratização do país. Para muito além de rótulos – poesia isso, poesia aquilo –, poetas como Guilherme Mansur e Antônio Barreto, um dos autores passenses que destacamos, exerceram a poesia como arte da comunhão, da agregação dos diferentes, do compartilhamento de afetos. Devemos muito a eles, especialmente os e as viventes das Minas Gerais conservadoras. Os dossiês são, por isso mesmo, gestos de reconhecimento em perspectivas diferentes, mas ambas movidas pelo horizonte ético, humanitarista, estruturante desta revista-território souziano.

Em consonância com o poeta que compreendia a palavra sinestesicamente, para muito além do grafocentrismo eurocêntrico, Sphera coloca aqui em relevo nada menos que quatro produtores de artes plásticas em suportes diversos. O primeiro é o fotógrafo Germano Neto, amigo e colaborador de Guilherme Mansur em vários trabalhos, inclusive no Suplemento Literário de Minas Gerais, de que o agora saudoso “tipoeta” (assim Haroldo de Campos chamou Mansur) foi designer gráfico durante vários anos. Estampamos neste número um ensaio fotográfico de Neto sobre o sertão mineiro e sua gente em homenagem a Guimarães Rosa, cujos 115 anos de nascimento completaram-se em 27 de junho passado. O segundo é João Diniz, arquiteto, poeta, artista múltiplo, que aqui comparece com a escultura “Versilindro”, produzida com a também arquiteta Bel Diniz. O terceiro é davi de jesus do  nascimento (ele assina assim mesmo), artista nascido às margens do São Francisco, na cidade de Pirapora, cujos trabalhos funde referências míticas e pops. E, finalmente, a quarta é Maria Médicis, uma profissional de contabilidade da cidade de Governador Valadares que, nas horas vagas, também se dedicava à pintura. Não chegou a se afirmar profissionalmente como artista, o que é bastante sugestivo sobre a condição da mulher até a segunda metade do século XX, condição que, infelizmente, ainda não é tão incomum. Além destes destaques, o número traz ainda poemas, prosas e o discurso de Silviano Santiago ao receber o merecido Prêmio Camões. Sigamos lendo, sonhando e lutando!

 

Anelito de Oliveira

Publisher de Sphera Habitações do Encantado

        

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