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Cinco poemas de Marcelo Ariel

Atualizado: 21 de out. de 2021

O Sr. MEU NOME É LEGIÃO, PORRA lê o jornal!


A primeira página diz

1100000 mortos


A guerra é longa

A morte não se cansa!


Bem ao lado da notícia

A foto dele: o assassino

andando de lancha


O olhar do Sr. MEU NOME É LEGIÃO, PORRA!

se move indiferente

pela hecatombe de seu povo

e conta com deleite

uma piada


Quando eu era moleque

lá no interior

era tão magro

que me chamavam

de parmito

Parmito....


A matéria do jornal

Traz o nome de todos

Os mortos sobre um fundo negro

Inútil tentar achar algum conhecido

nesta galáxia

que ao longe imita

as cinzas de uma floresta incendiada


O Sr. MEU NOME É LEGIÃO, PORRA!

Não possui compaixão ou imaginação

Nada vê nas páginas

além de um borrão

Por um segundo

um pensamento assustador

atravessa o rosto do Sr. Legião

um puxa-saco encontra

entre os mortos

seu homônimo

e grita ‘ Ainda bem que não é o Senhor, hein Patrão’

e com o rosto branco e

um sorriso amarelo de medo

o Sr. Legião apenas

repete assombrado pela razão

‘Ainda não’

e ele percebe que

aquelas páginas

contêm seu fim

semelhante ao daquele número

superior a um milhão




Dao De Jing

A partir de uma conversa com Chiu Yi Chi


O Dao é desnomeador

e o desnomeador é constante.

o nome que não pode ser dito

é a coisa

e a coisa que equivale ao Dao

é um gesto da luz .


Ao separarmos existência

e vazio

não estamos mais

grávidos do Céu e da Terra


Ao desejarmos o vazio

ainda que fora dele

nos tornamos cintilações


Ao desejarmos a existência

sem nenhum atributo

senão o acontecer

autônomo das coisas

nos tornamos

vestígios


os nomes todos

são sombras e luzes

nós fora de nossos nomes

sem origem discernível,

podemos ser

festejados pela coisa em si que ri

destes sons e sonos

como uma porta

aberta pelo vento

para um jardim

em frente a uma floresta

revela o que somos



HAKIM BEY NA OCUPAÇÃO 9 DE JULHO

“O Estado mundial será o corpo”

Novalis


I

Diadema é um dos nomes do monádico

que como o Pássaro da Eternidade

é buscado por aqueles que buscam

aquilo que jamais pode ser encontrado

porque aparece em nossos sonhos

a alma que é a paisagem invisível

apenas porque ainda não olhamos para ela


O paraíso florescendo nos olhos

daquelas que podem ouvir

aquilo que veem

O paraíso está nos olhos

daquele que os fecha para poder ver

Pergunte ao si mesmo que se opõe ao eu

porque o amadoamada sem nome

criou-se em árvores e também em cosmo


Chega-se até a favela de Eldorado pela elevação movente

através da fusão do um Quilombo com uma Tekoa

fusão opaciada pela dimensão dos negócios

onde a alma é convencida da inexistência do humano

depois ela será reconduzida até o começo do antisono, quando o dinheiro e a água forem bens públicos

reinvindicaremos isto, em outraoutrooutre

através da universidade desconhecida dos sonhos lúcidos

onde o corpo se vê retrovado

porque não existe ali

a necessidade nem da falsa imanência dos celulares

nem da medusa oblíqua dos espelhos

o rosto do outraoutrooutre

onde mergulhamos antes de nascermos

A gênese do lugar:

uma topologia fantasma

chamada Canudos

que se move

por dentro

do ônibus

lotado

que também é um massacre

embora incapaz de roubar

nossas potências nômades

nossa poderosa fragilidade

sempre lutando

contra os buracos brancos,

vencendo apenas

quando somos os observadores

na fenda etimológica

e anulamos a magia cinza econômico-jurídica da branquitude


porque a palavra PODER não pode nos prender;

eram apenas emanações do simulacro de um pesadelo

cercadas pela ocupação

a sede dourada

a fome amarela


Sabemos ao sentir tudo

no Aberto

que a língua da brisa

na copa das árvores

é mais real

do que a angústia

anunciando a magia dos órgãos sem eu

chamando a terceira pessoa do singular

até que venha o silêncio que é a força

Cosmogramática

Atravessando os corpos

através dele anularemos O PODER

com sua representatividade nula do irreal

o ex mundo será estilhaçado

por um tipo de polinização

de silêncios autopoéticos

que deslocam a percepção dos sonhos

para todos os outros estados

dos encontros

para todos os contornos e esboços

da presença do mundo

longe do encanto etimológico

que é como uma porta feita

com chaves coladas umas nas outras

com gelo e névoa

agora o ex mundo existe para ser dissipada pelo movimento

livre, despensado e solar do corpo

Todos os seus movimentos são celestes

do vento na teia de aranha

aos alvéolos

dos anéis de Saturno

até a imobilidade plástica

do sono

onde o sonho se move como o anjo da história

na não intencionalidade

espaço adentro.


II


Podemos sentir

que a vontade da matéria

está atrás do pensamento de todas as coisas

que estão umas dentro das outras

como a água na água-viva

e o som nas explosões solares

ecoando nas batidas do coração do Colibri

e nas do nosso

Sabemos que asas foram enterradas

no corpo das mulheres

há algo de sublime nos fios

entrelaçados que formam a matéria

na vontade dos fios

na vontade das asas

na autonomia

bioestelar

que empurra o sangue

para o Sol no alto da cabeça

dos animais

que empurra a seiva

para o alto da cabeça vegetal

o cérebro polifônico da copa das árvores

coreocosmogramatológico

como o cérebro das nuvens

e o dos rios

mas não apenas o cérebro : O CORPO

que os antigos chamavam de NÃO MENTE

O CORPO NÃO MENTE

A natureza, sem esquemas

As supernovas, sem esquemas

Ou seja EROS

Pólenomádico

e sua maravilhosa buceta

que um dia foi

A TERRA



Se


Se Todo ser é pluri- ou multi-modal, ou seja, existe de diversos modos: corpo, alma, fenômeno, coisa, etc.

Então não somos

E aquela fala do Coronel Kurtz/Marlon Brando em Apocalipse Now?

Era o Sweet Bird of paradox anunciando

sua própria tempestade interior

como o autodeclarado nazismo

de Ingmar Bergman e Heidegger

na juventude

o ser é costurado

por atos falhos e contradições

que não revelam nada.



Como ser o negro ou a matéria escura II

Adendo


O sinthoma


Para Ronald Augusto & Baco Exu do Blues



Um triunfo que existe

ATRAVÉS DE SEU CONTRÁRIO

Cada preto-preta é um quilombo que se move

no terrano sem Terra

uma classe muda de calçada

e chama a polícia

para o catador

que não fez nada

culpado até que se prove

a certeza de um mundo contrário

ao mundo


Foram os três

em flagrante

o Olhar de Machado, as mãos de Lima

pregadas na Cruz com Carolina

um cemitério clandestino

plantado no mar

entre Brasil

e a África

na esquina

vai continuar

no apagamento do Canindé

e Eldorado dos Carajás


nós somos suas sementes

cravadas no corpo desse negro-negra sem dentes

caído na calçada

dormindo embaixo de um cobertor sujo

imantado-imantada pelo

fluxo da crackolândia

onde se o branco vai

pretifica

ali e no Jazz

O Azul que vemos

em falso no céu

que em verdade vos digo

É UM CORPO

NEGRO

ESTELAR DO ESPAÇO

A Quizumba

infinita

e serve para acordar


o preto deitado na calçada se levanta

MULTICOSMIPLICADO

e quebra a corrente com o laço colonial

pelo nirvana

CONTEMPORÂNEO ANCESTRAL


CONVERGÊNCIAS

DE INSURGÊNCIAS

Essa é a fita


E ao se afastar

por dentro

da miragem projetada

na BIOS (DES) controlada

chamada identidade

um ponto estelar

se abre

e uma floresta renasce

nas raízes

da invisibilidade




Marcelo Ariel


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