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Seis poemas de Gildes Bezerra

Atualizado: 14 de set. de 2021


Corças


Se perdem,

Se entregam,

Se tomam.


De dia têm curvas,

De tarde são turvas,

De noite se despem.


São frágeis,

São ágeis

E firmes.


De dia são olhos,

De tarde são ancas,

De noite são pernas.


Se adornam,

Se enfeitam,

Se ornam.


De dia se olham,

De tarde se falam,

De noite se molham.

Se querem,

Se aderem,

Se colam.


De dia se almoçam,

De tarde se lancham,

De noite se bebem.


Se unham,

Se arranham,

Se mordem.


De dia são moças,

De tarde são laços,

De noite são corças.





Diário XCVI


Ela se veste

De palavras.

Seus jardins

São floridos de palavras.

O seu coração se esconde

Atrás de palavras.

Mas consigo abrir a cortina

Rendada de palavras

E vê-la despida,

A caminhar

Na direção do poente.




Poema submisso


Era como se mendigasse o privilégio de te ver.

E te reverenciasse como um súdito à sua rainha;

Ou baixasse a cabeça à tua presença

Como uma tímida e vergonhosa donzela

Diante do seu amo e senhor.

Ou como o garimpeiro curvado sobre a bateia

Olhando, extasiado, a fulguração do diamante.

Era como se tivesse que erguer a cabeça e os olhos

Para fitar uma estrela vespertina

Que antecede a multidão de luzes

No intermitente infinito.

E, no entanto, éramos apenas

Um homem e uma mulher.



Poema de esperar


Quando não houver mais orgulho no silêncio

E os gestos da noite forem amenos, sem vidraça,

E a dor adormecer com o acalanto de mãos amigas;

Quando o frio passar,

Eu voltarei.




Poema exilado


O caminho já não me diz dos teus segredos.

Talvez por medo da noite nos olhos

E das sombras púrpuras que ralentam

O tempo forte, o ritmo do coração.

O caminho já não pensa os meus desejos flanantes

Que respiravam entre tatos e mãos viageiras

Sobre curvas que pulsavam morenas e vivas.

O caminho já não me evoca

E nem mesmo sei se me sabe indiferente,

Rememorando tua boca cheia de dúvida e sede.

Mas um caminho retorna

Desde que as palavras desejem.




Poema sem agasalho


...e agora faz frio

Mas houve época em que os corações aqueciam os corpos.

Os sonhos se recolheram ao hangar do peito,

Mas já voaram amplidões, além dos olhos.

Estamos tristes. Apenas tristes.

As estações do ano se alternam

Assim como as noites e os dias. Mas agora faz frio.

E estamos tristes. Apenas tristes.




Gildes Bezerra

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